Por Dr. Frederic Flach
"Como se escolhe uma boa carreira? Às vezes por uma visão privilegiada das coisas, algumas por sorte, outras levados que somos, felizmente, por circunstâncias acidentais. O melhor tipo de trabalho é aquele que nos dá a oportunidade de empregar nossos talentos básicos. Todos temos esses talentos, sejam eles, simples, costurar uma roupa, ou complexos, como matemática superior ou física nuclear. Podemos encontrar as pistas desses nossos talentos lembrando a infância e a juventude e nos perguntando a que tipo de atividade nós preferíamos no dedicar então. Brincar é um barômetro importante nessa busca: por exemplo, passávamos o nosso tempo sozinhos, construindo aviõezinhos, colecionando selos, lendo? Ou preferíamos a companhia de outras crianças na maioria das vezes? Éramos bons na hora de redigir as composições na escola, ou melhores em biologia? E na hora de fazer pequenos trabalhos para ganhar algum dinheirinho, preferíamos trabalhar numa loja, numa construção ou como um instrutor esportivo? [...].
Quanto mais as reponsabilidades de nosso trabalho nos permitem usar nossos talentos e interesses manifestados na infância e na juventude, melhores profissionais seremos. Quando esses talentos e interesses falham em nos dar essa oportunidade, muitas pessoas encontram uma solução em suas vocações [...].
Estudos demostram que, quando uma organização se torna muito grande, é difícil para a maioria das pessoas se identificar com o conjunto. Automaticamente, essas pessoas se sentem parte de um pequeno segmento; esses segmentos se multiplicam e se tornam autolimitados à medida que a organização cresce. Mesmo dentro de nosso pequeno setor, talvez nunca tenhamos uma visão geral do que somos; como resultado disso fica difícil extrair daí um sentido de identidade, propósito, e eficácia do nosso trabalho [...].
Tudo indica que não vamos trabalhar dentro de uma determinada estrutura o resto de nossas vidas. Se começamos trabalhando na ABC Eletronics, quando tínhamos vinte anos, a companhia talvez não exista quando chegarmos aos trinta e cinco. E mesmo que dure um século, nosso sentido de lealdade- se temos algum- não vai durar tudo isso. Ambição, oportunidade e mudança provavelmente nos levarão para outros lados [...].
Todos temos a propensão de pensar que o amanhã será mais ou menos como o dia de hoje. Estamos dispostos a admitir quer as mudanças estão no ar, mas lá no fundo do coração acreditamos que no próximo ano, ou daqui a dez ou vinte anos, estaremos vivendo num mundo bem parecido com aquele com o qual nos acostumamos. Embora estejamos vivendo confortavelmente, prosseguir nesse ritmo com base em tais crenças pode ser muito perigoso. Acho que muita gente jovem e inteligente hoje conhece bem esse risco e se comporta de acordo com isso – seja se tornando mais frenética no seu trabalho, como forma de negar suas percepções íntimas de fragilidade, ou então se lançando numa vida descompromissada, cheia de prazer e mobilidade, sem muito trabalho. É curioso, acho essa tendência mais comum entre homens jovens do que mulheres jovens. Essa observação se for válida, pode se explicar pelo fato de que as mulheres têm tido, nos últimos anos, mais oportunidade de fazer carreiras em campos antes exclusivos dos homens; assim, pelo menos por enquanto, elas tiram estímulo e motivação da novidade pura que é a sua nova situação [...].
Talvez então, em algumas circunstâncias, esta hesitação em se comprometer e o desejo de manter abertas as opções reflitam de fato um enfoque mais intuitivo e criativo em relação a um futuro muito incerto e a determinação de estar pronto quando chegar esse futuro. Tanto é assim que a preparação parta a idade adulta deveria trazer a ênfase numa forma de educação mais ampla, formadora da mente e do caráter, educação que requer o estudo dos clássicos, da Filosofia, das línguas, da história e da ética, só para lembrar algumas, como pré-requisito para irmos em direção a campos de atividades mais especializados [...].
Claro, problemas como ter casa para morar e comida na mesa não vão desaparecer. O que necessitamos é a habilidade criativa para viver em diferentes níveis ao mesmo tempo, encontrando um lugar para nós dentro do sistema existente, num grau adequado à sobrevivência do dia-a-dia, mas ainda ficando um pouco à distância, abertos a mudanças dentro de nós mesmos e de nosso mundo. Para conseguirmos isso precisamos de RESILIÊNCIA e, como parte dela, a descoberta do significado que dará sentido a nossas vidas."
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*Excertos extraídos do capítulo 19 do livro "Resiliência A Arte de Ser Flexível, do Dr. Frederic Flach, editora Saraiva, 1991, 1ª edição - São Paulo
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