segunda-feira, 24 de junho de 2019

Uma grande lição de Ética Profissional com Michael Clayton (Conduta de Risco)

O Cinema, conhecido também como a sétima arte, tem como objetivo principal o entretenimento. Mas ele pode ir além da função lúdica de apenas nos entreter e assim então, nos passar pertinentes lições nos mais diversos campos do conhecimento humano, como a Ética Profissional, por exemplo. E é sobre esse tão caro tema que trata o esplêndido filme “Michael Clayton”, traduzido no Brasil como “Conduta de Risco”.

Quem já o assistiu sabe do que se trata, mas como o filme é de 2007, vale muito a pena trazê-lo à tona para usá-lo como exemplo em razão da lição arrebatadora de Ética Profissional que o filme nos ensina. Sem entrar no mérito estético do filme, é oportuno citar que trata-se do gênero suspense/policial, com performances brilhantes dos atores George Clooney em seu melhor papel, Tom Wilkinson, Sydney Pollack e Tilda Swinton. Para esta inclusive, lhe rendeu um  Oscar como atriz coadjuvante. Realmente um show de interpretação de cada um deles. O filme ainda ganhou 4 Globos de Ouro.

É um filme difícil, repleto de detalhes, diálogos inteligentes e muito bem construídos e deve ser assistido com muita atenção. A história  gira em torno de quatro personagens: Michael Clayton (Clooney), Arthur Edens (Wilkinson), Karen Crowder (Swinton) e Marty Bach (Pollack). Clayton é um consultor  do importante escritório de advogacia, Kenner, Bach & Ledeen, cujo sócio proprietário é Marty Bach (Pollack); Arthur Edens é um brilhante advogado que trabalha para Bach e Karen Crowder é presidente e conselheira da U-North, uma empresa de defensivos agrícolas e cliente do escritório de Bach.

É importante traçar o perfil de Michael Clayton: sagaz e bem articulado, trabalha como consultor há 15 anos para Marty Bach. É responsável por dar um jeito nas causas “sujas” e que parecem sem solução. Viciado no jogo de poker, deve para bancos, deve para agiotas, tinha um restaurante que foi penhorado por dívidas, além de estar passando por um complicado divórcio. Como podemos constatar, sua situação financeira não é nada confortável. Importantíssimo guardarmos esse perfil.

A U-North está expandindo os negócios pelo mundo, porém, antes será preciso liquidar um pesado processo judicial coletivo de pessoas que foram contaminadas pelo uso do herbicida vendido no mercado pela empresa. O escritório de Bach é responsável pela defesa através do advogado Arthur Edens (amigo pessoal de Clayton). Edens faz acordos individuais com os reclamantes. O processo já se arrasta há 5 anos e Edens sente que há algo muito errado e começa a investigar a U-North a fundo.

Edens acaba tendo acesso a um decisivo documento denominado “Memorando 229”. Esse documento é um relatório de pesquisa elaborado por um engenheiro químico da própria U-North e que comprova que a matéria prima utilizada na fabricação do herbicida é altamente cancerígena. Um dos diretores da U-North, Don Jeffries, toma ciência e assina o relatório mas não toma providências. Karen, recém promovida a CEO da U-Noth é uma executiva ambiciosa e sem escrúpulos e também nada faz a respeito.

Arthur Edens então adota uma estratégia: durante uma audiência de acordo com um dos reclamantes do processo contra a U-North, ele simula um surto de loucura e tira a roupa perante todos os presentes. É preso. Karen Crowder indignada, informa Bach do ocorrido. Bach aciona Michael Clayton para limpar a sujeira de Arthur Edens e colocar panos quentes na situação. Clayton consegue a soltura de Edens que continua simulando um surto de loucura.

Arthur Edens não fala coisa com coisa para Clayton, mas diz que tem sangue nas mãos durante esses 5 anos que defendeu a U-North. Clayton ainda não está a par do Memorando 229 e Edens nada diz a respeito. Clayton tenta convencer Edens a retornar para a causa, mas em vão. Clayton tem um encontro com a presidente da U-North, Karen Crowder, para apaziguar a situação, mas ela não simpatiza com Clayton e o trata com arrogância.

Arthur Edens muda de endereço, pois com o memorando 229 em mãos está mesmo decidido a mudar de lado. Michael Clayton o encontra novamente, os dois discutem e Arthur continua simulando transtorno. Clayton então procura Marty Bach e este confirma a Clayton que Edens com certeza mudará de lado e poderá por tudo a perder. Bach sugere a Clayton que interne Arthur Edens mas Clayton sabe que isso será impossível.

Karen Crowder já sabe que Arthur Edens tem o Memorando 229 em mãos. Ela contrata dois mercenários, especialistas em espionagem industrial para grampear Edens e seguir os seus passos. Eles descobrem que Arthur Edens está telefonando para os envolvidos no processo contra a U-North e dizendo a eles que podem ganhar a causa e que ele tem em mãos algo importante que provará a culpa da U-North.

Karen ordena os mercenários matarem Arthur. Eles fazem o serviço com uma injeção letal fazendo crer que Arthur se suicidou espalhando comprimidos pelo chão do loft. Todos no escritório de Bach sentem a morte de Arthur. Michael Clayton desconfia que não foi suicídio, Bach também concorda que conhecendo Arthur por mais de 30 anos ele jamais cometeria suicídio.

Na madrugada, Michael Clayton decide violar o lacre da polícia e invade o loft que Arthur morava. Ele vasculha tudo e acaba encontrando um recibo de uma loja de cópias reprográficas que estava escondido dentro de um livro. Ele guarda o recibo com ele. Clayton também está sendo seguido pelos mercenários contratados por Karen Crowder.

Clayton vai até a loja de cópias e descobre enfim o que lá estava guardado. Eram centenas de cópias do memorando 229 que Arthur mandou fazer para entregar a cada um dos envolvidos no processo contra a U-North. Clayton (sempre seguido pelos mercenários) fica com uma cópia e vai mostrá-la a Marty Bach.  Clayton questiona Bach que eles estão do lado errado! Mas Bach confirma que sabia de tudo desde o primeiro dia em que assumiu a causa e que a U-North é a responsável por manter as despesas do seu escritório pagando altíssimos honorários mensais. E mais, se o escritório não fechar o acordo urgente com os reclamantes, Karen vai processá-lo por negligência profissional cometida pelo Arthur naquela fatídica audiência em que ele surtou.

Clayton sai arrasado e vai espairecer num jogo de poker numa espelunca. É seguido pelos mercenários que já sabem que Clayton agora também dispõe de uma cópia do memorando 229. Os mercenários comunicam a Karen que Clayton tem uma cópia do memorando. Karen dá ordem para matar Clayton. Enquanto Clayton está jogando, os bandidos colocam uma bomba no carro de Clayton.

Clayton recebe uma chamada para atender uma causa comum de atropelamento. Na volta é seguido pelo carro dos mercenários que estão esperando uma distância oportuna para acionar o detonador da bomba. Mas Clayton (que não sabe que está sendo seguido) pega um desvio na estrada e encosta o carro. Ele desce para respirar o ar fresco do amanhecer. Ele caminha pela relva quando a bomba é detonada em seu carro. O quebra cabeça se completa. Clayton deduz que Arthur foi assassinado e agora ele é o alvo. O memorando 229 estava no bolso de seu paletó e não foi queimado na explosão de seu carro. Karen pensa então que Clayton está morto.

E aqui chegamos na parte final. Clayton vai até o local onde Karen Crowder já livre do processo coletivo (o escritório de Bach fechou o acordo com os reclamantes), está palestrando para as empresas que representarão a U-North em outros países. Clayton aguarda no hall do salão por Karen. Quando ela sai da sala e o vê, obviamente ela se assusta, pois ela acredita que ele foi explodido.

O diálogo final entre Michael Clayton e Karen Crowder é algo simplesmente arrebatador. E aqui devemos retornar ao perfil de Michael Clayton. Ele não seria o caso de ser comprado ao invés de ser eliminado? É nessa linha que vai seguir o diálogo entre os dois. É um diálogo curto e de uma sagacidade retórica perturbadora conduzida por Clayton, e que vai terminar de maneira surpreendente cujo resultado é uma soberba lição de Ética Profissional. No jogo de xadrez isso tem o nome de gambito da dama ou do rei. Não vou dar o spoiler, mas quem teve a oportunidade de assistir já sabe o que acontece.

O mundo corporativo precisa de Michael Claytons, eles existem, estão espalhados por aí, ainda que sejam poucos. Meia dúzia de gatos pingados eu diria? São  firmes, impávidos e inabaláveis em sua conduta (de risco?) ética profissional que, é até estranho dizer isso, arriscam até a perderem seus empregos em nome dessa conduta.

Obs: Conduta de Risco pode ser facilmente encontrada em Blu-Ray ou DVD. Há uma versão dublada ( mas o áudio não está muito bom) disponível no Youtube. Vale a pena conferir aqui.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Aposentadoria por Invalidez, Auxílio-Doença Acidentário e Recuperação Judicial não afastam a manutenção do plano de saúde





As dúvidas e inseguranças sobre a manutenção do plano de saúde pelas empresas que o concedem a seus funcionários são constantes. Ao que tudo indica, muitos departamentos de Recursos Humanos estão desatualizados (ou no piloto automático) da legislação sobre o tema. Questões como Aposentadoria por Invalidez, Auxílio-Doença Acidentário e Recuperação Judicial são as principais dúvidas sobre a continuidade do plano de saúde mantido pelas empresas. Vejamos:

Recentemente recebi uma consulta de um senhor aposentado por invalidez. Ele foi chamado para comparecer à empresa que, por motivos de estar passando por uma recuperação judicial estaria cancelando o seu plano de saúde. Para quem ainda não sabe, a aposentadoria por invalidez não extingue o pacto laboral com o empregador, conforme Decreto 3.048/99, artigos 46/50. Nesse caso, o contrato de trabalho fica suspenso por tempo indeterminado, pois, como há perícia médica a cada dois anos, a invalidez pode ser cancelada e o laudo médico declarar que o paciente está novamente apto para retornar ao trabalho.

O plano de saúde, benefício concedido por deliberação do empregador não pode ser cancelado de maneira alguma nas seguintes situações: aposentadoria por invalidez e auxílio-doença acidentário. Esse é o entendimento pacífico do Tribunal Superior do Trabalho –TST, através da Súmula 440. Vejamos:

Súmula 440/TST - 25/09/2012. Acidente de trabalho. Auxílio-doença acidentário. Aposentadoria por invalidez. Suspensão do contrato de trabalho. Reconhecimento do direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica. CF/88, art. 1º, III e IV. CLT, art. 468.

“Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez”

Tratemos agora das empresas em Recuperação Judicial. Para quem não sabe, a Recuperação Judicial (antiga concordata), grosso modo, é um recurso jurídico utilizado por uma empresa para evitar a sua falência e viabilizar os compromissos para com os seus credores e manter, sobretudo, as relações trabalhistas. E manter as obrigações trabalhistas é justamente uma das condições sine qua non para que a Recuperação Judicial seja concedida pelo juiz. Isso quer dizer que a Recuperação Judicial não afasta a obrigação da empresa em manter o plano de saúde concedido aos seus colaboradores, principalmente os que estão afastados por auxílio-doença acidentário e aposentados por invalidez, conforme Súmula 440 do TST, citada acima.

Já existem diversas decisões convergentes da justiça favoráveis ao trabalhador, quando a empresa cancela o plano de saúde em tais situações. A alegação das empresas para o cancelamento do plano de saúde é que não há previsão legal para manter o benefício. Um grande equívoco que revela desinformação pois, a Súmula 440 do TST trata justamente da questão em comento. Vejamos o trecho final de uma sentença prolatada pelo juiz André Parisenti:

"O silêncio da legislação não pode ser interpretado como autorização para que o empregador encerre o benefício justamente no período em que o empregado mais necessita porém, mesmo durante os períodos de suspensão contratual permanecem exigíveis as obrigações acessórias inerentes à mera existência do vínculo empregatício". Processo 0020769-71.2016.5.04.0021.

Agora, vejamos o parecer da juíza Larissa Leônia Bezerra de Andrade Albuquerque:

"É sabedor que durante a suspensão do contrato de trabalho não há prestação subordinada de serviços, assim como não há o pagamento de salário, contudo, o contrato de trabalho permanece em vigor, com manutenção de todos os benefícios acessórios deferidos aos empregados, tais como o plano de saúde, já que os mesmos se incorporam ao contrato de trabalho e ao patrimônio jurídico do empregado e sua supressão unilateral afronta o artigo 468 da CLT”. Processo 0000445-08-2014.5.10.0007

Entremos agora no terreno dos danos morais. Sim, o cancelamento indevido do plano de saúde pelas empresas de aposentados por invalidez ou afastados por auxílio-doença acidentário implica em dano moral em favor do empregado. Assim entendeu a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18º Região, conforme voto da desembargadora Rosa Nair ao julgar o recurso ordinário interposto por uma empresa em recuperação judicial.

«A relatora iniciou seu voto afirmando que a condição de empresa em recuperação judicial não afastaria a obrigação em relação aos direitos dos empregados, pois não cabe ao trabalhador assumir os riscos do empreendimento. Rosa Nair salientou que a concessão do benefício da aposentadoria por invalidez implica a suspensão apenas das obrigações diretamente relacionadas à prestação de serviços, tais como pagamento de salário e contagem de tempo de serviço. Todavia, as garantias contratuais, especialmente as de natureza social como o plano de assistência médica devem ser preservadas conforme o voto da desembargadora. A relatora trouxe, ainda, o entendimento da Súmula 440 do TST que prevê a obrigatoriedade da manutenção do plano de saúde enquanto suspenso o contrato de trabalho por aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença acidentário.

Sobre a condenação por danos morais, a magistrada esclareceu que o dano moral neste caso é presumido, pois é incontroverso que a aposentadoria da autora se deu por invalidez, em decorrência de doença gravíssima, aneurisma não tratável. A suspensão do plano de saúde, conforme Rosa Nair, causou prejuízo à trabalhadora ao ser excluída de seu plano por uma atitude negligente da empresa. Assim, a desembargadora manteve a condenação afastando apenas a aplicação de correção monetária e juros, conforme a Súmula 439 do TST. A decisão da turma foi unânime.» [1].

Para concluir, ainda é importante destacar que, cláusulas no acordo coletivo que disponham sobre o cancelamento do plano de saúde são consideradas fraudulentas e inválidas pela justiça. Vimos então que, constitui-se ato ilícito cometido pelo empregador o cancelamento do plano de saúde dos aposentados por invalidez e dos afastados por auxílio doença acidentário, devendo portanto, a reparação de danos morais em conformidade com os artigos 5º, X da Constituição Federal e artigos 186 e 927 do Código Civil.
_________________________________________________
[1] Tribunal Regional do Trabalho 18ª Região - Goiás

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Aprendendo Sociologia do Trabalho com a música sertaneja de raiz



"Empregado quando é bom o patrão é companheiro" (Tião Carreiro & Pardinho)

A Literatura, o Cinema e a Música representam uma inesgotável fonte de sapiência e aprendizado. Algumas vezes de maneira complexa, outras de maneira mais simples. Absorvemos as mensagens dos mais belos filmes que assistimos, dos clássicos da literatura que lemos com tanto prazer e também das elaboradas melodias que ouvimos. E dessa fonte de saber, portanto, ganhamos um aprendizado intelectual e prestimosas lições de vida que nortearão nossa conduta ética, moral, pessoal e profissional para sempre. E a música sertaneja de raiz tem muito a nos ensinar. É o que veremos a seguir:

A saudosa dupla Tião Carreiro e Pardinho, que compunha a legítima música sertaneja de raiz, cantou magistralmente as relações de trabalho na bela melodia, “O Patrão e o Empregado”, composta por José Dias Nunes (o Tião Carreiro) em parceria com outro compositor, um craque da música caipira, Lourival Santos. A letra da canção é um verdadeiro elogio ao capitalismo e retrata da maneira mais realista possível as relações entre patrão e empregado. Uma tijolada sem dó nem piedade na verborrágica luta de classes pregada pelo aldrabão (embora inteligentíssimo, devemos reconhecer) Karl Marx, que, é sempre bom lembrar, nunca trabalhou na vida, vivia às custas dos amigos e nunca colocou os pés numa fábrica [1].

E por falar em Karl Marx, nunca é demais reiterar o que já escrevi em diversos artigos neste blog sobre a teoria do valor-trabalho, de Marx. Essa teoria maluca do alemão Marx que odiava judeus, embora fosse um deles, foi espetacularmente refutada pelo economista Carl Menger, o fundador da Escola Austríaca de Economia, em seu livro, “Princípios de Economia Política”, publicado em 1871 . E não somente por Menger, mas também pelo economista Eugen von Böhm-Bawerk, também da Escola Austríaca, na sua obra, "A Teoria da Exploração do Socialismo-Comunismo", que pode ser baixada aqui.

Tião Carreiro não frequentou escola, aprendeu a ler e escrever folheando jornais e revistas. Autodidata, aprendeu por conta própria a tocar viola e criou um estilo único e inconfundível de manusear o instrumento, estilo esse que foi seguido por inúmeras duplas sertanejas que tiveram o mestre Tião Carreiro como fonte de inspiração. Também aprimorou o estilo da cantar das duplas sertanejas, colocando ênfase na segunda voz, a mais grave como destaque, estilo também seguido por diversas duplas.

Eis aqui então a bela poesia da canção, “O Patrão e o Empregado”, uma verdadeira aula de Sociologia do Trabalho, pois a relação entre ambos se completam e é vista sob uma condição natural criada por Deus. Assim sendo, podemos dizer sim, por que não, que nessa singela melodia, Tião Carreiro e Pardinho também refutaram e com muita maestria a imaginária e ilusória luta de classes que nunca existiu na verdade, pregada pelo vivaldino Karl Marx.


Eu estava sem assunto a lei divina mandou
Passei a mão na viola o meu santo me ajudou
Pra falar de duas classes que a tempo Deus criou
Empregado e patrão ainda ninguém falou
Empregado é abençoado patrão Deus abençoou

Empregado e patrão duas linhas paralelas
Para defender os dois eu estou de sentinela
No futebol do trabalho os dois juntos faz tabela
Constrói a grande vitória que o país precisa dela
Pátria precisa dos dois e os dois lutam por ela

Empregado quando é bom o patrão é companheiro
Empregado dá suor e o patrão dá o dinheiro
O dinheiro é coisa boa pra aqueles que sabe usar
Usando só para o bem o dinheiro faz cantar
Usando só para o mal o dinheiro faz chorar

Já trabalhei no pesado, pisei descalço na neve
Hoje no braço da viola o meu serviço é mais leve
Sou empregado dos fãs que pra mim nada me deve
Eu é quem devo resposta da carta que o fã me escreve

Desde o tempo de menino conheci um velho ditado
O patrão quando é rico empregado é remediado
O que vou dizer agora eu não deixo pra depois
Quem trabalha para pobre não sai do feijão com arroz
Trabalhar pra quem é pobre é pedir esmola pra dois.

Compositores: Jose Nunes / Lourival Dos Santos
__________________________________________________
[1] JOHNSON, Paul (1990), "Os Intelectuais", Imago

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Entregadores de aplicativos derrubam a CLT



Eles já são quatro milhões de pessoas atualmente prestando seus serviços para as plataformas de aplicativos no Brasil. Seja de moto, bicicleta, carro, patinete e até mesmo a pé. Atendem a um contingente de dezessete milhões de usuários dessas plataformas, dados esses levantados pelo Instituto Locomotiva. E aqui temos um belo exemplo de que a CLT é absolutamente dispensável. São os novos tempos em que o livre mercado nos ensina espetacularmente as regras naturais de oferta e demanda e, por conseguinte, surgem as novas atividades de trabalho totalmente autônomas.

Apesar da rotina intensa de 12 horas de trabalho por dia, às vezes até mais do que isso, esses entregadores trabalham com imensa alegria e satisfação, chegam até a emendar um turno  ao outro, pois o rendimento bruto desse serviço compreende de dois a quatro mil reais por mês. Além disso, eles têm a liberdade e autonomia para ir embora a qualquer momento, não há carga horária a ser cumprida, não há relação de subordinação e, portanto, nenhum resquício de vínculo empregatício. Nem eles querem isso, passam ao largo da regulação estatal.

De acordo com a pesquisa da Fundação Instituto Administração (FIA), desse contingente de entregadores, 97,4% são homens (embora o número de mulheres esteja aumentando consideravelmente); 73% completaram o ensino médio e 11,7% têm curso universiotário (não, não errei a grafia), alguns até mesmo concluindo a pós-graduação. Seu lema de trabalho é: “O trabalho é a gente que faz”, pois eles mesmos escolhem o horário, trabalham o quanto querem e encerram o expediente quando bem entenderem. 

Entre eles, há profissionais que exercem atividades com vínculo empregatício em jornada de meio período, e à noite prestam serviços de entregadores de aplicativos para complementar a renda. Há inúmeros casos de profissionais que pediram demissão de seus empregos porque a atividade de entregador estava rendendo praticamente o dobro do que recebiam no emprego e melhor, sem patrão.

As entregas não se resumem apenas ao gênero alimentício, tais como, quentinhas, pizzas, lanches, etc. O negócio se expande exponencialmente a cada dia para uma gama de produtos, entre os quais, utensílios domésticos diversos, livros, perfumaria, remédios, produtos de petshops, inclusive a entrega de malotes de documentos entre empresas, haja vista a gritante ineficiência e preços abusivos dos serviços dos correios.

No entanto, como não podia deixar de ser, aparecem os palpiteiros estatólatras de plantão que adoram um chicote estatal cantando no lombo dos outros. É o caso de uma “especialista” da Unicamp em estudos sindicais (demorou, como não??), que denomina a atividade pejorativamente como “uberização do trabalho” (uma referência ao aplicativo Uber), bostejando a verborreia de sempre sobre exploração desumana, submissão aos algoritmos (oi?), a famigerada falta de uma carteira assinada e também da seguridade previdenciária. Posição essa que é compartilhada apenas por meia dúzia de gatos pingados entre os entregadores mal informados, pois a maioria rechaça carteira assinada e demais esmolas estatais.

Em razão da boa remuneração bruta e livre de descontos que recebem, já consideradas as despesas de manutenção e combustível (quando é o caso) muitos já têm convênio médico e odontológico, alguns até já aderiram em plano de previdência privada. Naturalmente que nem tudo é um mar de rosas, quem almeja obter um bom rendimento mensal tem que trabalhar duro, se bobear de sol a sol e sob as intempéries, como muitos já fazem, porém, sempre com a liberdade e opção de poder parar a qualquer momento e quando quiser. Estão plenamente conscientes em arcar com os custos, riscos e consequências da atividade.

Nas relações de trabalho sempre será preciso pensar fora da caixa, pois trabalhar com vínculo empregatício via CLT ou prestar concursos públicos são coisas do passado totalmente desconectadas da nossa realidade. Que o digam os Ghost Writers, os Influenciadores Digitais, os Entregadores de Aplicativos e outros tantos que virão por aí. Quem diria que um dia, apenas um celular e uma bicicleta dariam um olé  na CLT, um aglomerado de normas e regras insanas e que vencidas espetacularmente pelo livre mercado, esse rebotalho não tem mais razão de existir, se é que algum dia teve. A CLT chegou ao fim e já faz algum tempo, só não vê quem não quer.

*As anotações e a Caixa de Ferramentas

Por Sönke Ahrens “Quando pensamos que estamos fazendo diversas tarefas, o que realmente fazemos é deslocar nossa atenção rapidamente entre d...