Bem, segundo a chef me contou, era uma noite chuvosa de final de inverno e não havia muito movimento na cidade. Passava da meia noite e ela já estava se preparando para fechar o restaurante quando um carro adentra no estacionamento do estabelecimento. Era um casal de meia idade e uma adolescente. Perguntaram se ainda havia refeição e a chef confirmou. No cardápio daquela noite uma das opções era pernil de cordeiro ao molho de laranja, opção essa que foi escolhida pelos clientes. Pedido feito, mãos à obra.
Na cozinha os preparos para o prato começam. Tudo corria muito bem. Só que não! Na hora da cozinheira preparar o molho de laranja, cadê a laranja? Ninguém se deu conta que a laranja havia acabado. Era quase uma hora da manhã, cidade do interior, tudo fechado, não havia aonde comprar laranja naquele horário. A chef então passou uma mensagem para sua casa (cidade pequena é tudo perto), ela iria bem rápido de carro buscar as benditas laranjas. E de novo, só que não! A sua mãe lhe respondeu que não havia laranjas em casa. Então a chef pensou em oferecer uma segunda opção aos clientes. Mas antes ela deu uma última olhada no freezer e o que ela viu? Ela viu latinhas de refrigerante de laranja! Isso mesmo, refrigerante de laranja e com gás!
Bem, então ela tomou as rédeas, pegou as latinhas e colocou em prática toda a experiência que adquiriu no ramo da gastronomia. Primeiro ela providenciou um processo para neutralizar todo gás do refrigerante. Aqueceu, emulsionou, colocou um tempero aqui, outro ali, umas ervas, encorpou o molho com araruta, fez aquela alquimia de sabores que só ela sabia e voilà, nasceu um molho de laranja sem as laranjas! Naturalmente que todo pessoal da cozinha provou antes de servir sobre o pernil de cordeiro.
Pratos servidos, clientes satisfeitos, não notaram nada de errado. Segundo a chef, apreciaram , elogiaram e deixaram uma boa gorjeta para ser dividida com a garçonete e a cozinheira. Ela ainda me disse que improvisar na cozinha é algo bem comum no dia a dia. Ela já tinha feito antes experiências com caldos feitos a base de refrigerante e segura de sua habilidade, sabia que iria dar certo.
Após ela me contar esse episódio, eu ainda tinha uma dúvida e perguntei a ela: "e se não tivesse latinhas de refrigerante de laranja no freezer?” Ela não pensou muito e me deu uma resposta inacreditável: “eu teria feito o molho com suco em pó, aquele do envelopinho e ia ficar tão bom quanto”!! Provado está então que um tempero indispensável na rotina de chefs de grande talento e habilidade não é uma latinha de refrigerante, mas uma boa dose de improvisação!
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