segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Teste Rorschach (borrões de tinta) é ineficaz nas entrevistas de seleção



Muitos candidatos nas entrevistas de seleção já passaram pelo teste Rorschach, dependendo do cargo pretendido. O teste consiste em olhar para figuras representadas por manchas ou borrões de tinta e responder ao entrevistador o que o candidato enxerga em cada uma delas. É como a pareidolia em que as pessoas enxergam rostos, vultos e figuras em nuvens, montanhas, etc. Algumas empresas ainda insistem nesse teste para avaliação das aptidões dos candidatos. Mas será que o teste Rorschach realmente funciona? Vejamos um pouco de história.

O teste foi criado (não tão criado assim) pelo psicólogo suíço Hermann Rorschach (1884-1922). Quando jovem, Hermann era fissurado num jogo chamado Kleksographie. O jogo consiste na arte de criar imagens a partir de manchas de tinta e foi criado (acidentalmente, diga-se de passagem) pelo escritor e poeta alemão Justinus Kerner. Rorschach então decidiu (pasmem!) que essa técnica poderia ser utilizada no campo clínico para avaliação das mais diversas personalidades de pacientes com problemas mentais.

Ocorre que o pedagogo e psicólogo francês Alfred Binet (1857-1911)  o precursor do teste de QI, já estava trabalhando com manchas de tintas para avaliação da inteligência humana. Além de Binet, em 1896 nos Estados Unidos, apareceu um outro jogo descrito por Albert Paine & Ruth McEnery Stuart, denominado Gobolinks que consistia em como fazer monstros com borrões de tinta e usá-los em versos criativos. Como podemos observar, Rorschach não foi o pioneiro nos borrões de tinta como muita gente imagina.

O teste dos borrões de tinta (são 10 pranchas com borrões diferentes) obviamente requer um método de codificação e interpretação para avaliação. Hermann Rorschach faleceu prematuramente antes que pudesse elaborar um método de codificação para o seu próprio teste. O seu falecimento ocorreu justamente quando o seu livro com as pranchas das tintas estavam praticamente impressos. A venda do livro foi um tremendo fracasso uma vez que não havia uma explicação clara sobre o propósito daquelas pranchas com borrões aleatórios.

Após o falecimento de Rorschach, vários pesquisadores e psicólogos se debruçaram sobre a questão e desenvolveram os mais diversos métodos de codificação e interpretação do teste. Atualmente os dois sistemas mais utilizados são: o sistema de Exner (John E. Exner) e o sistema de Bhom (Ewald Bohm). Existem muitos outros e assim sendo, podemos concluir que não há consenso sobre um método preciso e adequado de codificação e interpretação.

Vejamos agora, grosso modo, alguns dos principais traços característicos que o teste Rorschach pretende avaliar:


- A quantidade de inteligência

- A qualidade de inteligência

- Afetividade

- Atitudes Gerais

- Humor

- Traços Neuróticos


A aplicação dos testes é utilizada nos campos jurídico-forense, clínico, educacional, organizacional, etc. Devem ser aplicados apenas por psicólogos habilitados e treinados no teste conforme determinação e critério do Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos-SATEPSI. No Brasil foi introduzido no ano de 1927 pelo médico Ulisses Pernambuco com a contribuição da psicóloga russa Helena Antipoff e do psiquiatra José Lemes Lopes.

Já escrevi em diversos artigos sobre testes de inteligência nas entrevistas. A comunidade científica refuta com veemência testes de aferição da inteligência como por exemplo os testes de QI pela falta de precisão, afinal, de acordo com a comunidade não existe medida científica para a inteligência. Assim sendo, não poderia ser diferente com o teste Rorschach com suas imprecisões e diversos métodos de codificação ao redor do mundo.

O que nós vemos num borrão de tinta? Vemos um borrão de tinta, oras! Outra resposta diferente dessa vai depender muito da subjetividade de quem faz a pergunta e não há como fugir disso. A possibilidade de forjar ou manipular os resultados, bem como, as respostas é infinita ao gosto de quem aplica o teste.

Quem já pesquisou o mínimo sobre História da Arte da qual a arte abstrata faz parte, sabe muito bem que de nada adianta perguntar ao artista pintor que criou uma pintura abstrata o que significa aquelas manchas ou borrões. A pintura abstrata é apenas uma composição de cores e traços que o artista criou até chegar num visual belo e agradável de se ver e puramente decorativo sem nenhuma teoria mirabolante por trás a respeito do que ele quis transmitir com sua arte.

Portanto, o teste Rorschach é análogo  à pareidolia, algo para lá de ridículo se levado a sério numa entrevista de seleção de pessoas para avaliar aptidões. Como entretenimento lúdico, propósito pelo qual foi criado em sua origem, pode até ser divertido num happy hour, brincar numa roda de amigos de enxergar figuras aonde elas não existem, sobretudo quando começamos a enxergar bailarinas e sereias sorrindo e dançando no líquido etílico dentro do copo que já comporta  a quinta ou sexta dose de whisky barato.


segunda-feira, 8 de setembro de 2025

À Altura (The Match): filme recomendado que aborda a difícil relação entre mestre e aluno




"Não importa olhar um para o outro, mas ambos olharem na mesma direção, para frente e mais para o alto" (Saint-Exupéry)


À Altura (The Match) está sendo considerado como um dos melhores filmes do gênero drama lançados esse ano pela Netflix.  Baseado em fatos reais, o filme conta a história dos dois maiores campeões nacionais e internacionais de “Go”, respectivamente, Cho Hun-hyun e seu aluno e futuro campeão, Lee Chang-ho, ambos sul-coreanos. Go é um complexo jogo de tabuleiro criado na China há mais de 2.500 anos sendo provavelmente o jogo mais antigo do mundo e que trata do cerco e domínio de territórios representados no tabuleiro por peças brancas e pretas.

Os protagonistas dão um show de interpretação, o professor e campeão Cho é interpretado pelo talentoso ator Lee Byung-hun e seu aluno Lee é interpretado por Yoo Ah-in (já adulto) e Kim Kang-hoon (garoto), ambos atuam magistralmente. A semelhança física com os campeões reais é impressionante. A direção é do competente cineasta e roteirista Kim Hyeong-ju, conhecido por alcançar resultados surpreendentes ainda que sempre trabalhe com baixo orçamento. Destaca-se também o cenário e a fotografia impecáveis da ambientação do filme na década de 80 ocasião em que se deu o encontro entre mestre e aluno.

Cho, após vencer mais um campeonato conhece um garoto (Lee) prodígio que costuma jogar GO nas praças da cidade e vencer todas as partidas disputadas ao mesmo tempo com diversos jogadores. Cho o observa jogar, reconhece que o garoto tem enorme talento, provavelmente vê nele um futuro campeão de Go, porém o garoto precisa de mais sutileza e treinamento apesar de jogar muito bem. Cho lhe faz um convite para treiná-lo em sua casa. Lee então, feliz da vida, aceita o convite e se muda para a casa do campeão e mestre Cho.

A relação entre mestre e aluno é bastante conflitante. Cho é duríssimo e implacável com Lee nas lições que compreendem as aberturas, ataques e defesas das partidas. Lee é admitido no clube de Go da cidade e vai ganhando todas as partidas que disputa, não há páreo para ele a não ser o seu mestre Cho que sempre demonstra insatisfação com o estilo de jogo de seu pupilo. 

O tempo passa e Lee desenvolve secretamente o seu próprio estilo de jogo, estilo esse que seu mestre Cho não aprova por julgar falta de sutileza e de classe. Até que chega o dia da disputa do campeonato oficial no qual o campeão Cho terá que enfrentar o segundo jogador no ranking que é nada mais nada menos do que seu aluno Lee. É uma partida tensa, angustiante que leva quase um dia, pois dois gigantes estão disputando o campeonato mundial. Cho perde a partida para o seu aluno Lee que se sagra campeão. Lee não se empolga, muito menos comemora a vitória para o espanto dos repórteres e fotógrafos presente que acompanharam a partida.

É a partir desse ponto que o drama vai se desenrolar, pois a vitória de Lee causará mudanças nas personalidades de mestre e aluno. Lee deixa a casa de Cho e retorna para a casa de seus pais. Ele se torna um sujeito apático e melancólico enquanto Cho não consegue digerir a derrota para o ex-aluno. Até que Cho encontra um jogador de Go, Nam (Jo Woo-jin) seu ex rival de inúmeras partidas e que fará com que Cho resgate o campeão e grande mestre que ele é. Cho e Lee se encontrarão novamente para uma outra disputa de campeonato.

Bem, apesar de muitos que assistiram o filme tenham reprovado as lições duras e implacáveis que Cho impunha a seu aluno, o mestre enfim entendeu que as suas duras lições fizeram com que Lee acabasse criando o seu próprio estilo de jogo diferente de seu mestre. Mas como nos ensinou o filósofo Sócrates, não é esse mesmo o papel do mestre? Forjar o aluno para que descubra o seu próprio caminho e estilo para um dia então deixar de ser aluno e se tornar também um mestre? Entendo que Cho cumpriu o seu papel  magistralmente e com muita maestria fazendo com que Lee se tornasse um mestre de GO e campeão absoluto por anos consecutivos tal como Cho, o seu mestre. Leonardo da Vinci que foi um grande mestre sabiamente escreveu em seus cadernos de anotações:

"Triste discípulo aquele que não se esforça para ultrapassar seu mestre; e é um triste mestre aquele que se indigna de ver seus discípulos preocupados em ultrapassá-los".

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

O Jazz sempre tem algo a ensinar sobre liderança compartilhada




A organização que improvisa*

Por Frank. J. Barrett**

Como seria uma organização que procurasse aprender com bandas de jazz? Os gerentes, para começo de conversa, teriam grande respeito pelas estratégias emergentes e teriam o cuidado de não separar aqueles que estão formulando a estratégia dos responsáveis pela sua implementação, porque a ação cria o feedback que fundamenta o próximo passo. Para isso, a alta gerência estaria com a mão na massa, aprendendo sobre as mudanças no ambiente e obtendo regularmente experiência prática e concreta.

A organização que improvisa criaria estruturas fluidas que se formam, se dissolvem e voltam a formar à medida que surgem novas situações e novos desafios. Grupos d projeto não seriam formados como resultado de sessões de de planejamento abstratas a priori, mas sim à medida que as situações exigissem. Grupos seriam formados e dissolvidos, reunidos para abordar determinados assuntos e servir a funções específicas e, em seguida, seriam dissolvidos.

A estratégia seria criada de forma retrospectiva, à medida que as pessoas experimentassem algo, formassem grupos para discutir a questão e, em seguida, articulassem qual seria a estratégia. Pessoas de diferentes áreas funcionais conversariam regularmente, compartilhariam insights e expertise de acordo com o que a situação exigisse. Expressões de espanto seriam comuns quando surgissem insights de lugares improváveis em momentos imprevisíveis e à medida que os empregados chegassem a novos acordos por meio de processos colaborativos.

As organizações criariam diretrizes mínimas, permitindo que os empregados se orientassem para situações concretas e seguissem seus palpites, dando contribuições necessárias. A energia oscilaria, à medida que indivíduos e grupos seguissem suas paixões ou reagissem a um desfio adaptativo. Haveria uma noção de descoberta comum à medida que as pessoas deparassem com situações de difícil solução, explorassem ideias e considerassem opções, descobrissem novas possibilidades apenas depois de ações experimentais já terem sido iniciadas. Mandatos de cima para baixo seriam recebidos com desconfiança, ou até mesmo ignorados, por medo de que pudessem atrapalhar as negociações de baixo para cima e os processos de análise.

Em vez de ficarem isolados em seus estilos, os funcionários trabalhariam em vários projetos ao mesmo tempo e pertenceriam a diversas equipes. Conversas e interações entre os silos criariam um modo de diálogo fundamentado na curiosidade. Perguntas surgiriam: De onde vem isso? Como você descobriu aquilo? Por que sou o único que não sabia disso? Por que não percebemos isso antes? Por que? Não porque todos quisessem bancar os especialistas, mas porque os empregados nunca estariam muito satisfeitos com o que sabem, nunca completamente confiantes de que estariam preparados para o que acontecesse a seguir.

Já que significados e cenários seriam fluidos, as pessoas utilizariam menos a clareza cognitiva e ficariam mais à vontade com a incerteza e a ambiguidade. Seria mais fácil admitir o que você não sabe e sentir livre para buscar a ajuda dos outros para obter informações; seria mais fácil também assumir qualquer papel solicitado quando surgisse a necessidade. Uma cadeia hoteleira que quisesse enfatizar o serviço quatro estrelas, em que todos os empregados seriam responsáveis por deleitar o cliente, se livrou de todos os títulos dos cargos. Todos os funcionários passaram a ser, a partir de então, “associados”, e era igualmente esperado d todos que respondessem aos pedidos independentemente de fazerem parte das exigências de departamentos específicos.

Assim seria uma organização que improvisa. Na Roadway Trucking, onde os empregados da linha de frente participam ativamente do planejamento estratégico, os motoristas de caminhão não esperaram ter aprovação para usar o celular para comunicar informações importantes sobre as remessas de carga e horários de entrega. Ao contrário, tomaram a iniciativa de comprar celulares e começaram a usá-los para demonstrar que esse importante recurso deveria ser financiado pelo departamento.

“Todos fazem de tudo” – esse é um bom lema para bandas de jazz e para organizações que querem aprender a improvisar. As apresentações de jazz não são aleatórias nem acidentais. Os músicos se preparam para serem espontâneos, afinal como dizia o lendário baixista de jazz, Charles Mingus, “ninguém improvisa do nada”.

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*Excertos adaptados do capítulo 8 do livro, "Sim à Desordem, de Frank J. Barrett, editora Elsevier, 2013, Rio de Janeiro

**Frank J. Barrett é professor de Administração e Políticas Públicas Globais, doutor em Comportamento Organizacional , músico e pianista de Jazz.


segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O Efeito Dunning-Kruger no ambiente de trabalho

"O problema da humanidade é que os estúpidos estão cheios de certezas, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas" (Bertrand Russel)


Sabe aquele supervisor, gerente ou mesmo colega de trabalho que adora convencer os seus parceiros só no grito? Sempre aos berros, acredita que seja o dono da verdade em tudo, ninguém sabe mais do que ele e não admite o contraditório nem qualquer crítica ou questionamento? Isso tem um nome: Efeito Dunning-Kruger.  No entanto, o inverso também ocorre e portanto temos duas situações:

- pessoas com baixa competência tendem a superestimar as suas habilidades.

- pessoas competentes tendem a subestimar as suas habilidades.

Muitos ambientes de trabalho estão cheios desse tipo de pessoa. O vídeo abaixo muito divertido explica detalhadamente como essa síndrome foi descoberta por dois psicólogos sociais, David Dunning e Justin Kruger após analisar um assalto a banco mal sucedido.

O único caminho para evitar o efeito Dunning-Kruger é investir no conhecimento permanente e ter a humildade em reconhecer que não se pode saber tudo nesse mundo. Com a palavra o filósofo Sócrates: 

"Eu só sei que nada sei".









segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Fanáticos e viciados em CLT


Tivemos dia desses um debate instigante publicado numa rede social denominado “1 patrão VS 30 demitidos”. Pelo lado do empregador, a presença do empresário Tallis Gomes e do outro lado 30 pessoas que foram demitidas das empresas nas quais prestavam serviço. O debate revelou entre outras coisas como ainda algumas pessoas se apegam cegamente à Consolidação das Leis do Trabalho-CLT sem se darem conta da armadilha perversa que esse diploma lhes confere.

Um dos grandes erros absurdos da CLT, entre tantos outros é colocar empregado e empregador em lados opostos como se inimigos fossem. Isso é um ilusão, um precisa do outro, o empregado é o valioso capital humano que todo empregador dispõe para o seu empreendimento. Aliás, diga-se de passagem, que a CLT é por si própria um terrível erro, nenhum outro país no mundo possui um diploma tão violento que impede na prática a fluência perfeita das relações de trabalho entre empregado/empregador. Fosse a CLT tão boa, milhares de pessoas de outros países viriam para cá a procura de emprego, porém na prática ocorre o oposto, existe sim fuga de mão de obra para outros países.

Ao longo dos anos tenha demonstrado em diversos artigos deste blog a artificialidade dos ditos “direitos trabalhistas” que não são gerados diretamente do contrato de trabalho, mas de um diploma tacanho, legado paternalista/getulista e imposto pelo Estado coercitivo, um diploma que pune tanto empregador quanto o trabalhador. Sim, o trabalhador se engana quando acredita que a CLT lhe dá “direitos”, pois tais “direitos” são pagos por ele próprio ainda que indiretamente sem que ele tenha a percepção desse esbulho.

Há algum tempo escrevi um artigo "Salário do trabalhador deveria ser o dobro do que recebe" o qual recomendo e demonstro porque o trabalhador deveria receber o dobro do que ele vale como profissional no mercado de trabalho. É muito simples de entender, todo o pacote de “direitos” obrigatórios que o empregador paga inclusive a parcela da previdência social que é subtraída do próprio salário do trabalhador fatalmente reflete no valor nominal da remuneração salarial que poderia ser quase mais que o dobro não fosse esse pacotaço de “direitos” artificias coercitivos.

Basta uma análise rápida sobre os efeitos produzidos pela CLT para se colocar em cheque praticamente todos os seus artigos. Como pode um diploma dispor de regras iguais para centenas de profissões absolutamente diferentes? O artigo 58, por exemplo, que dispõe sobre a jornada de trabalho igual para profissões que precisam de jornadas absolutamente diferentes durante o expediente. O artigo 9, mais um exemplo que podemos citar que impede e veta flexibilidade ou acordos entre empregado/empregador. Cada artigo é uma dupla tijolada, um tijolo acerta a cabeça do empregador e outro a cabeça do trabalhador, embora o tijolo do trabalhador venha revestido numa bela, irresistível e enganosa embalagem travestida de “direitos trabalhistas”.

O ensino formal desde os primeiros anos estimula o fomento por políticas públicas e a veneração pelo Estado de bem estar social, a imagem do empreendedor é sempre vilipendiada cravando-lhe na testa um selo de explorador. Na conclusão do curso superior temos de um lado um contingente de concurseiros e de outro um contingente de viciados em CLT que iludidos pelo o que foi ensinado aguardam nas filas de empregos pelos seus pacotaços de “direitos trabalhistas”.  Vínculo empregatício são palavras sagradas,  enquanto empreendedor, que seja anátema!

Esse vício por CLT não é difícil de curar. A prescrição compreende doses maciças de escola austríaca de economia, leituras muitas de anarcocapitalismo e libertarianismo e praxeologia várias vezes ao dia. Quem seguir essa prescrição em pouco tempo nem chegará perto de uma CLT, um só artigo já será mais do que suficiente para lhe causar engulhos. A opção de laborar como PJ também é uma excelente vacina que uma única vez inoculada a pessoa estará curada e imunizada do vício celetista para todo e sempre.









segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Propriedade intelectual não existe*




Casos de plágios musicais sempre acabam sendo repercutidos pelas mídias e redes sociais. Não faz muito tempo tivemos o caso de um desconhecido compositor brasileiro que acusou a cantora britânica Adele de ter plagiado um trecho de uma de suas composições. O compositor ajuizou uma ação pleiteando indenização. Por enquanto ele se deu mal porque a justiça se declarou incompetente para julgar a questão. Trata-se de um caso que faz parte do tema Propriedade Intelectual (PI), um tema pra lá de polêmico e que abrange as mais diversas profissões, atividades econômicas e as relações de trabalho.

Ainda existe muita confusão e dúvidas sobre o tema, pois podemos desmembrar os tipos mais comuns de Propriedade Intelectual em: Direitos Autorais, Patentes, Segredo Comercial e Marca Registrada. Cada tipo tem as suas especificações e que mudam de país para país. Cada país elabora suas leis no que diz respeito à Propriedade Intelectual. 

No Brasil temos duas leis que tratam do tema, a Lei nº 9.279/96 que regula os direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, incluindo patentes, marcas, desenhos industriais e indicações geográficas e a Lei nº 9.610/98 que trata dos direitos autorais, obras literárias e artísticas.

Grosso modo, de acordo com premissas lógicas, primeiramente é preciso ter uma clara definição de propriedade para depois concluir se propriedade intelectual faz algum sentido ou não. E de acordo com a Lógica, não faz sentido algum, pois toda propriedade é inexoravelmente um bem escasso. Bem escasso é bem finito e ideias não são escassas e portanto não são finitas. Não há como roubar ideias! Ideias podem ser copiadas, porém não roubadas. Se você copia uma ideia de alguém, a pessoa não fica sem a ideia e não importa muito o que você fará com ela, ou seja,  se vai ganhar algum dinheiro ou não.

Bem, imagine se somente os descendentes dos irmãos Wright teriam direito de fabricar aviões, imagine se somente os descendentes de Louis Daguerre detivessem os direitos sobre as máquinas fotográficas e assim por diante. A humanidade não chegaria aonde chegou.

Não é preciso um tratado científico para provar a impossibilidade lógica da propriedade intelectual, embora dentro em breve escreverei um artigo mais detalhado a respeito. Imagine que você, funcionário de uma empresa crie um software para melhorar a produtividade de sua equipe. Quais são os seus direitos pela criação? O software pertence a você ou à empresa? A ideia foi sua mas... a animação que ilustra este artigo poderá responder essas questões. E se você discorda você está errado! Afinal, quem nunca baixou música, filme, livros, etc. da Internet? Quem nunca?

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Nota: Video compartilhado do canal Ação Horizontal - Alisson Neres


segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Sobre a liberdade de errar, segundo Ludwig von Mises*




“O fato é que, no sistema capitalista, os chefes, em última instância, são os consumidores. Não é o Estado, é o povo que é soberano. Prova disto é o fato de que lhe assiste o direito de ser tolo. Este é o privilégio do soberano. Assiste-lhe o direito de cometer erros: ninguém o  pode impedir de cometê-los, embora, obviamente, deva pagar por eles. Quando afirmamos que o consumidor é supremo ou soberano, não estamos afirmando que está livre de erros, que sempre sabe o que melhor lhe conviria. Muitas vezes os consumidores compram ou consomem artigos que não deviam comprar ou consumir.

Mas a ideia de que uma forma capitalista de governo pode impedir, através de um controle sobre o que as pessoas consomem, que elas se prejudiquem, é falsa. A visão do governo como autoridade paternal, um guardião de todos, é própria dos adeptos do socialismo. Nos Estados Unidos, o governo empreendeu certa feita, há alguns anos, uma experiência que foi qualificada de “nobre”. Essa “nobre experiência” consistiu numa lei que declarava ilegal o consumo de bebidas tóxicas. Não há dúvida de que muita gente se prejudica ao beber conhaque e uísque em excesso. Algumas autoridades nos Estados Unidos são contrárias até mesmo ao fumo. Certamente há muitas pessoas que fumam demais, não obstante o fato de que não fumar seria melhor para elas. Isso suscita um problema que transcende em muito a discussão econômica: põe a nu o verdadeiro significado da liberdade.

Se admitirmos que é bom impedir que as pessoas se prejudiquem bebendo ou fumando em excesso, haverá quem pergunte: “Será que o corpo é tudo? Não seria a mente do homem muito mais importante? Não seria a mente do homem o verdadeiro dom, o verdadeiro predicado humano?” Se dermos ao governo o direito de determinar o que o corpo humano deve consumir, de determinar se alguém deve ou não fumar, deve ou não beber, nada poderemos replicar a quem afirme: “Mais importante ainda que o corpo é a mente, é a alma, e o homem se prejudica muito mais ao ler maus livros, ouvir música ruim e assistir a maus filmes. É pois dever do governo impedir que que se cometam esses erros.”

E como todos sabem, por centenas de anos os governos e as autoridades acreditam que esse era de fato o seu dever. Nem isso aconteceu apenas em épocas remotas. Não faz muito tempo, houve na Alemanha um governo que considerava seu dever discriminar as boas e más pinturas – boas e más, é claro, do ponto de vista de um homem que, na juventude, fora reprovado no exame de admissão à Academia de Arte, em Viena: era o bom e o mau segundo a ótica de um pintor de cartão-postal. E tornou-se ilegal expressar concepções sobre arte e pintura que divergissem daquelas do Füher supremo.

A partir do momento em que começamos a admitir que é dever do governo controlar o consumo de álcool do cidadão, que podemos responder a quem afirme ser o controle dos livros e das ideias muito mais importante?

Liberdade significa realmente liberdade para errar. Isso precisa ser bem compreendido. Podemos ser extremamente críticos com relação ao modo como nossos concidadãos gastam seu dinheiro e vivem sua vida. Podemos considerar o que fazem absolutamente insensato e mau. Numa sociedade livre, todos têm, no entanto, as mais diversas maneiras de manifestar suas opiniões sobre como seus concidadãos deveriam mudar seu modo de vida: eles podem escrever livros; escrever artigos; fazer conferências. Podem até fazer pregações nas esquinas, se quiserem – e faz-se isso, em muitos países. Mas ninguém deve tentar policiar os outros no intuito de impedi-los de fazer determinadas coisas simplesmente porque não se quer que as pessoas tenham a liberdade de fazê-las.”

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*Excertos extraídos do capítulo II do livro "As Seis Lições", de Ludwig von Mises, editora José Olympio, RJ, 1979

segunda-feira, 28 de julho de 2025

A febre do morango do amor




A mão invisível do livre mercado produz mesmo milagres. De repente, em alguma plataforma das redes sociais alguém publica uma atrativa sobremesa conhecida como “morango do amor’. A postagem viraliza e em poucos dias muda a vida de confeiteiros, docerias, aplicativos de entrega e produtores de morango. Não existe algo mais belo e moral do que isso, haja vista a quantidade de profissionais e setores da economia envolvidos nessa demanda pelo doce engendrada pelo livre mercado. 

Na verdade não há nada demais nessa sobremesa, pois trata-se de uma variação de outro doce já conhecido, a “maçã do amor”, iguaria criada nos Estados Unidos no início do século XX concebida pelo confeiteiro William W. Kolb. Ele teve a ideia de cobrir a fruta com uma calda na cor vermelha através da utilização de corante alimentício, batizando a iguaria como “maçã do amor”.  Em Londres, desde 1890 já se produziam maçãs caramelizadas cujo nome era “toffee apples”, embora não na cor vermelha. Lembrando também que no norte da China desde a Dinastia Sung já se produziam um tipo de iguaria denominada thanghulu que nada mais eram do que frutas mergulhadas em calda de açúcar caramelado, depois espetadas num palito eram vendidas nas ruas e nas praças pelas doceiras chamadas tiánshí tānzhǔ.

Pois bem, após a viralização nas redes sociais, milhares de confeiteiras publicaram suas receitas do “morango do amor’”. É uma sobremesa até simples que implica em envolver o morango com um creme de brigadeiro branco e depois cobri-lo com a calda vermelha de açúcar cristalizado. Parece fácil, não? O problema é que achar o ponto dessa calda não é tão fácil assim, poderá ficar muito dura ou borrachuda. É preciso utilizar termômetro culinário para saber o ponto correto.

O resultado disso traduzido em números é o seguinte: a demanda pelo morango aumentou nesse curto espaço de tempo em 1333%; em apenas um mês os pedidos pelo Ifood aumentaram de 257 mil para 524 mil pedidos dessa iguaria. Uma confeiteira independente vendeu 12 mil unidades do doce faturando 34 mil reais em apenas alguns dias.

Entretanto, um setor que foi pouco citado nessa febre pelo “morango do amor” é o setor de odontologia que vai faturar horrores surfando nessa onda. Em razão da calda ser vitrificada já existem muitos casos viralizando nas redes de dentaduras e próteses dentárias arrancadas, dentes quebrados e gengivas perfuradas. Mais um setor econômico que entra em ação que é o dos profissionais da odontologia e claro, por tabela a venda de medicamentos.

A praxeologia é um método empírico criado pelo economista da escola austríaca de economia, Ludwig von Mises , cujo axioma central é  "o ser humano age com propósito. “O homem age.” Isso implica dizer que o ser humano realiza ações conscientes para alcançar fins, usando meios disponíveis". E apenas uma postagem -uma ação humana- de uma sobremesa nas redes sociais acendeu e movimentou a vida de diversos profissionais de diferentes setores da economia provou mais uma vez a premissa irrefutável de Ludwig von Mises. Ações humanas dessa natureza serão sempre bem vindas.



segunda-feira, 21 de julho de 2025

Sindicato é figura estranha ao contrato de trabalho




É sabido e notório que quem determina o piso básico de uma categoria profissional são os sindicatos. E por que é assim? Ora, basta tomar ciência do artigo 611 da CLT e uma infinidade de decretos leis e leis complementares que atribuem aos sindicatos todo tipo de negociação coletiva, inclusive a determinação do piso salarial de cada categoria profissional. Em outras palavras, o sindicato é quem determina quanto você, profissional, vale no mercado de trabalho tenha você experiência ou não. Podemos chamar isso de aberração ou mais uma jabuticaba jurídica brazuca.

A data base das convenções coletivas ocorre de maneira bienal ou anual, conforme a categoria profissional e que entre as cláusulas da convenção haverá uma que determinará o reajuste salarial que repõe a perda monetária que o salário sofreu durante o intercurso entre a última convenção e a atual. Outra cláusula também vai dispor de quanto será o piso salarial daquela categoria profissional. Por exemplo, se o piso for de R$ 2.000,00 reais, nenhum trabalhador poderá ser contratado por um valor abaixo desse piso, ainda que existam trabalhadores que aceitariam uma remuneração menor em razão da falta de experiência profissional.

E por que cada categoria profissional tem uma data base diferente? Para quem não sabe, a data base tem origem na data em que o sindicato foi criado, ou seja, se um sindicato de determinada categoria profissional iniciou suas atividade no mês de Maio, a data base daquela categoria será sempre no mês de Maio; se iniciou em Setembro, a data base será sempre em Setembro e assim por diante.

Até o início do século XX, o sindicalismo na maioria dos países surgiu da classe trabalhadora clamando por melhores condições de trabalho, já aqui no Brasil ocorreu um sindicalismo às avessas, de cima para baixo por imposição do Estado através do Decreto-Lei nº 1.637 de 1907. Há divergências entre os juristas que entendem que a primeira lei sindical do Brasil é o Decreto de 19 de Março de 1931 que em seu artigo 9º consagrou a unicidade sindical “proibindo a participação com ideologias políticas e religiosas, devendo restringir-se à defesa dos interesses profissionais". [1]

Após esses esclarecimentos, voltemos à vinculação do piso salarial determinado nos acordos coletivos sindicais. O contrato de trabalho caracteriza-se pela manifestação de vontade bilateral que envolve empregador/empregado. E isso já é o suficiente para entendermos que a instituição sindical é um agente absolutamente estranho ao pacto laboral bipartite e que, portanto, questões sobre remuneração não cabe ao sindicato, ou seja, determinar pisos, aumentos e reajustes, pois são questões restritas às partes contratantes, empregador/empregado.

O economista angolano austro-libertário José Macuva Chipalanga, é um profundo estudioso dos problemas sindicais em Angola, pois lá tal como no Brasil o sindicalismo também é um poderoso braço estatal que interfere de maneira insana nas questões salariais de trabalhadores. Em seu livro “Angola: O Que Deve Ser Feito? - Um Enquadramento Teórico-Histórico”, ele discorre com maestria sobre o tema e de forma cirúrgica ele diz em um trecho:

“O contrato de trabalho juridicamente não vincula a mão de obra ao lucro, pois a prestação de serviço é gerida e constituída pelo contrato enquanto o lucro é fundado na relação econômica. O Aumento salarial é gerado pela produtividade, oferta e demanda, capacidade financeira da empresa. Logo, sempre quando um aumento artificial é aplicado seja pelo governo ou pelo sindicato, haverá inevitavelmente corte na folha de pagamento."[2]

Outrossim, não há que se falar em adesão tácita do trabalhador vinculando-o ao sindicato da categoria ao assinar o seu contrato de trabalho. que repito, é exclusivamente bipartite que se restringe a ele, empregado e o empregador.

O valor remuneratório de um profissional está alinhado com a sua formação, experiência e atuação na sua área de trabalho e a demanda do mercado por esse profissional. Diante disso, o profissional sabe mais do que ninguém quanto vale o seu trabalho que pode ser menos ou mais do que o piso determinado pelos sindicato. 

O maior erro do piso salarial sindical é colocar no mesmo patamar salarial as mais diversas profissões. Por exemplo, se um analista de RH labora numa empresa metalúrgica seu piso será um valor, se labora numa instituição de ensino será outro piso, ou seja, para cada categoria ou atividade econômica o piso é diferente. Para o sindicato esse trabalhador não vale como profissional de RH mas como trabalhador de certa categoria/atividade econômica.

Isto posto, em países subdesenvolvidos e de terceiro mundo, o sindicato é quem determina o preço e quanto vale o profissional no mercado de trabalho, ainda que essa instituição seja estranha ao pacto laboral. E isso explica  porque a pejotização é um processo irreversível, ainda bem.

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[1] CASTAN, Vitor Manoel - Abuso do Direito Sindical, editora LTR, São Paulo, 2008

[2] CHIPALANGA, José Macuva - Angola: O Que Deve Ser Feito? - Um Enquadramento Teórico-Histórico”, editora UICLAP, 2024.



segunda-feira, 14 de julho de 2025

A boa aparência na entrevista de emprego e o efeito halo*




Os Motivos pelos quais gostamos de alguém:

"Mesmo que reconheçamos que pessoas de boa aparência têm uma vantagem na interação social, pesquisam indicam que podemos ter subestimado o tamanho e o alcance dessa vantagem. Parece haver uma reação clique, rode para pessoas atraentes. Como todas as reações assim, ela acontece automaticamente, sem premeditação. A resposta em si cai em uma categoria que os cientistas chamam de efeito halo. Um efeito halo ocorre quando uma característica positiva de uma pessoa determina a forma como ela é vista em relação à maioria das outras coisas. Os indícios são claros de que a beleza física é essa característica.

Nós automaticamente atribuímos a indivíduos de boa aparência traços favoráveis como talento, bondade, honestidade, afabilidade, confiança e inteligência. Além disso, fazemos esses julgamentos sem perceber que a característica atraente desempenhou um papel no processo. Algumas consequências dessa suposição inconsciente de que “bonito=bom” podem assustar. Por exemplo, um estudo de uma eleição federal do Canadá descobriu que candidatos atraentes recebiam 2,5 vezes mais votos do que os candidatos que não eram atraentes. Apesar dessa prova de favoritismo em relação a um político de melhor aparência, pesquisa posterior mostrou que os eleitores não percebiam essa tendência. Na verdade 73% dos eleitores canadenses pesquisados negaram fortemente que seus votos tivessem sido influenciados pela aparência física; só 14% chegaram a levantar a possibilidade dessa influência. Eleitores podem negar o impacto da beleza na possibilidade de eleição o quanto quiserem, mas indícios continuaram a confirmar sua presença pertubadora.

Um efeito parecido foi encontrado em situações de contratação. Em um estudo, candidatos mais bem arrumados para uma entrevista de emprego simulada influenciaram mais decisões favoráveis de contratação do que as qualificações profissionais –embora os entrevistadores dissessem que a aparência tinha um papel pequeno em suas escolhas. A vantagem dada a trabalhadores atraentes vai da contratação até o pagamento. Economistas examinando amostras americanas e canadenses descobriram que indivíduos atraentes recebem consideradamente mais que seus colegas de trabalho menos atraentes. Um cientista, Daniel Hamermesh, estimou que, ao longo da duração da carreira de uma pessoa, ser atraente gera para um trabalhador US$ 230 mil extras. Hamermesh nos garante que suas descobertas não são uma forma de se gabar, declarando que em uma escala de um a dez: “Eu sou um três”.

Outros experimentos demonstraram que pessoas atraentes têm mais chance de obter ajuda e são mais persuasivas para mudar opiniões de um público. Assim, é evidente que pessoas atraentes desfrutam de uma enorme vantagem social em nossa cultura. Gosta-se mais delas, ganham mais, são mais persuasivas, ajudadas comais frequência e vistas como possuidoras de traços de personalidade mais desejáveis e maior capacidade intelectual. Além disso, os benefícios sociais de ter boa aparência começam desde cedo [...]

Não é surpresa, então, que o efeito halo da beleza física seja explorado com regularidade por profissionais da persuasão. Como gostamos de pessoas atraentes e temos a tendência de concordar com aqueles de quem gostamos, faz sentido que programas de treinamento em vendas incluam dicas de vestuário; faz sentido que lojas de roupa selecionam seus vendedores entre os candidatos mais atraentes e por fim, faz sentido que vigaristas também sejam atraentes.”

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*Excertos extraídos do capitulo III do livro, “As Armas da Persuasão 2.0”, de Robert. B. Cialdini, editora Harper Collins, Rio de Janeiro- 2021


segunda-feira, 7 de julho de 2025

As famigeradas baias ou cubículos labirínticos



Você leitor que está lendo este artigo, talvez esteja fazendo a leitura sentado (ou em pé!) numa desconfortável baia cujo nome oficial é o pomposo Action Office II também chamada de estação de trabalho. Qual funcionário de escritório já não passou pelo desprazer de laborar enclausurado numa terrível baia? Vamos ver neste artigo de onde surgiu essa geringonça, quem a inventou, quem a fabricou e com qual finalidade.

O pai da criança é o inventor americano Robert Propst (1921-2000). Artista Gráfico e Escultor, Propst desenvolvia engenhocas (tão úteis como rodas quadradas), estudioso do ambiente de trabalho, ofereceu seus serviços como consultor para a empresa fabricante de móveis Herman Miller. Propst foi contratado em 1958 para desenvolver um tipo de mobiliário para interiores de escritórios.

Durante a criação do projeto para escritórios, Bob Propst contou com a ajuda do renomado designer George Nelson, um entusiasta da estética da elegância e modernista. Propst estudou vorazmente publicações de sociologia e ciências comportamentais que tratavam da interação homem/ambiente de trabalho; entrevistou (segundo ele mesmo!) trabalhadores das mais diversas profissões e após pesquisas e estudos, voilà, Propst apresenta em 1964 o mobiliário para escritório que ele batizou de Action Office.

De início o Action Office de Bob Propst foi rejeitado tanto pelos funcionários e, sobretudo pelos executivos que estavam diante de um produto de altíssimo custo, pois o material empregado para compor o módulo de três peças era muito requintado. E sejamos sinceros, esteticamente falando era uma opção  atrativa, graças ao designer George Nelson; amigável para o funcionário e que não lembra em nada as baias mequetrefes atuais. Custava muito caro razão pela qual não vendeu quase nada.

Propst não se deu por vencido, ele radicalizou e se debruçou em um novo projeto expurgando a sofisticada beleza e requinte de materiais que havia no antigo móvel e finalmente em 1968 ele entrega o Action Office II. Dessa vez o produto recebeu um pesado marketing de vendas, inclusive a publicação na imprensa de um manifesto de 72 páginas discorrendo sobre as “maravilhas” (oi?) dessa segunda versão muito mais enxuta, brutal, feita com materiais baratos, descartáveis de quinta categoria que é praticamente o conhecemos hoje como as famigeradas baias. E estava inaugurada a era dos chamados cubículos nos escritórios.


Mas o que na verdade Propst queria? Bem, ele queria mesmo era reforçar a autoridade de gerentes e supervisores que ficavam em salas independentes e colocar os subalternos em constante estado de vigilância. Ele não estava interessado em conforto e beleza, pois segundo ele, a beleza pura estava em ver funcionários andando de um lado para o outro produzindo sem parar e alucinadamente, afinal, conforme uma citação do próprio Propst, ”o homem é uma máquina orientada verticalmente”.

Enquanto na Europa os escritórios seguiam modelos mais arrojados e ergonômicos,  as empresas americanas surfaram maciçamente na onda das baias entulhando os escritórios de biombos e divisórias. Quanto mais funcionários aprisionados num espaço pequeno, labiríntico e barato, muito melhor. Fábricas de móveis começaram a replicar e exportar para outros países o modelo Action Office II (que já era péssimo) da maneira mais tosca possível que são os modelos do tipo cubículos que ainda encontramos atualmente por aí em diversas empresas. Existem em torno de 42 versões diferentes do Action Office II, cada uma pior do que a outra.

George Nelson, o designer que colaborou com o projeto original que foi abortado, enviou uma carta ao fabricante Herman Miller lamentando o efeito desumanizador como ambiente de trabalho do Action Office II. Num trecho da carta ele diz.

“Não é preciso ser crítico especialmente perceptivo para entender que o Action Office II definitivamente não é um sistema que produz um ambiente gratificante para as pessoas em geral. Só é admirável para projetistas à procura de maneiras de juntar o número máximo de corpos, de empregados (em contraposição a indivíduos), de pessoal, os zumbis corporativos, os mortos-vivos, a maioria silenciosa. Um grande mercado”.

Funcionários adoeciam porque os cubículos restringiam a circulação de ar insalubre. Pesquisas indicavam oscilação de temperatura, correntes de ar, baixa umidade, altos níveis de ruído, escassez de luz natural e falta de ventilação, além da falta de privacidade com documentos sigilosos. Os sindicatos entraram em ação apontando condições desumanas nos escritórios e reivindicando melhores condições de trabalho. Fato curioso é que nem mesmo a Herman Miller, empresa que fabricou o Action Office II utilizava a mobília em seus escritórios muito bem requintados e sofisticados. Era praticamente o fim do Action Office II.

Página virada, os designers começaram a se inspirar nos modelos europeus de layout no ambiente de trabalho nos escritórios: ambientes espaçosos, arrojados e muito bem iluminados por luz natural e presença verde de vegetação. Esse tipo de layout já foi comprovado por empresas que estudam o impacto do layout no ambiente de trabalho o aumento da produtividade entre 6 a 10% e aumento da criatividade em 15%. Sim, a Beleza importa, transforma e contribui no resultado em termos de ambientes criativos e mais produtivos.

Portanto, há mais de 30 anos empresas dispensaram o uso do Action Office II, atualmente não passa de um bric-à-brac inútil exposto em museus de objetos bizarros nascidos de criações insanas. No entanto o que é mais bizarro ainda é encontrar empresas que ainda utilizam essa mobília sádica nas dependências de seus escritórios. Tais empresas deveriam então estampar em cada baia um pequeno quadro emoldurado com a imagem do marques de Sade, de preferência olhando e sorrindo sarcasticamente e com o dedo em riste na cara de quem está laborando.

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Notas

SAVAL, Nikil - Cubiculados - A História Secreta do Local de Trabalho - Editora Anfiteatro - Rio de Janeiro, 2014



segunda-feira, 30 de junho de 2025

Agam, o anjo do Monte Rinjani*




Nesta semana praticamente o mundo todo se comoveu com o caso da jovem alpinista Juliana Marins que infelizmente perdeu sua vida ao tentar vencer o vulcão Monte Rinjani na Indonésia. Juliana tropeçou e caiu montanha abaixo e as primeiras imagens da jovem ainda viva aguardando pelo resgate ganhou o mundo todo. Todos ficamos na torcida, porém as condições meteorológicas desfavoráveis e o serviço precário de resgate daquele país foram determinantes para selar o destino da jovem Juliana nas areias movediças daquele vulcão. No entanto, em meio ao descaso das autoridades responsáveis pelo resgate se destacou a figura de Abdul Haris Agam, mais conhecido como Agam Rinjani, um experiente montanhista voluntário que por conta própria reuniu recursos e uma equipe de alpinistas experientes para resgatar Juliana.

Agam é natural de Makassar, sul da Indonésia, formado pela Universidade de Hasanuddin, alpinista, produtor de café e atua como voluntário em resgates. Quando tomou conhecimento que as autoridades locais mentiram em passar informações equivocadas sobre o resgate de Juliana, imediatamente Agam reuniu sua equipe de voluntários e por conta própria partiu do sul da Indonésia para resgatar a jovem.

Ao chegar ao local da queda, Agam e sua equipe enfrentaram o clima adverso, chuva forte e frio. Quando chegaram onde estava Juliana, ela já estava sem vida. Mesmo assim, ele passou a noite ao lado de Juliana à beira de um penhasco de 600 metros impedindo que seu corpo escorregasse ainda mais naquele lamaçal. Além da chuva, Agam e sua equipe também enfrentaram a chuva de pedras que passavam rentes aos seus corpos. Agam chegou a ferir uma de suas pernas. Ao amanhecer, quando então uma equipe de bombeiros chegou Agam carregou o corpo de Juliana até o topo.

Até o momento, Agam que ganhou o apelido de "anjo", já conta com, 1,2 milhão de segudiores em seu Instagram. Uma vaquinha foi feita para ajudá-lo ou recompensá-lo por sua bravura, que de início ele relutou em aceitar, depois aceitou e vai repartir a ajuda com seus colaboradores que o ajudaram no resgate e também aplicará parte da ajuda em plantio de árvores.

Agam pediu desculpas por não ter conseguido trazer Juliana com vida, embora isso em nada diminui a sua coragem, bravura e solicitude. No mais, Agam tem o perfil de um líder nato: o voluntarismo, tomar iniciativa sem esperar ajuda do Estado e sem esperar reconhecimento, firme e inabalável até quando o criticaram por ter o hábito de estar sempre com um cigarro entre os dedos, calmo e bem humorado; habilidade em improvisar em situações adversas e possivelmente algumas outras qualidades que ainda não sabemos. Mas sabemos que salvar vidas é a sua vocação maior. O mundo precisa de mais Agams, são pessoas assim que fazem a diferença nos piores momentos da vida. E Agam é o cara que faz a essa diferença.

Encerro aqui com uma de suas frases motivacionais que ele com frequência publica em seu Instagram:

“É preciso coragem para começar algo — e uma alma forte para terminar”.

*Este artigo faz parte da seção deste blog "Profissionais acima da média". Essa seção presta homenagem aos profissionais que em alguns momentos de suas carreiras foram além e que de alguma maneira nas tomadas de decisões acabaram se destacando e fazendo a diferença


segunda-feira, 23 de junho de 2025

O problema das estatísticas em questões trabalhistas




Quando dados estatísticos são utilizados como amostragem para confirmar alguma premissa do setor trabalhista estamos diante de um perverso dilema. Quando alguém diz ou a mídia publica que de acordo com as estatísticas “mulheres ganham menos que os homens”, na verdade estamos diante de uma petição de princípio. Em Lógica , petição de princípio é uma premissa ou afirmação falaciosa feita por alguém cuja prova de verdade é a própria premissa declarada sem demonstrar qualquer evidência que a confirme como verdadeira. E aí é que a estatística surge como suporte e acaba piorando ainda mais a situação.

Amostras estatísticas não raro, estão sempre contaminadas pelo viés de quem as encomendou e a metodologia das pesquisas de campo será sempre indutiva, ou seja, parte-se do particular para o todo para provar o objeto da pesquisa. Por exemplo, se fui mal atendido numa empresa por dois ou três funcionários, logo todos os funcionários dessa empresa atendem mal os seus clientes. Temos um problema aqui, não? É óbvio que se dois ou três funcionários não me atenderam bem, isso não significa que os demais também me atenderiam mal.

Além disso, o tipo das perguntas feitas para compor dados estatísticos numa pesquisa obviamente serão sempre tendenciosas na intenção de obter as respostas que o agente que encomendou a pesquisa gostaria de ouvir. 

Vejamos o que o autor Douglas Walton discorre em seu livro “Lógica Informal” no capítulo em que ele trata das perguntas tendenciosas e das estatísticas sem sentido e incognoscíveis:

“A parcialidade ou viés pode ser introduzida na amostra através de perguntas tendenciosas, que conduzem à conclusão que o pesquisador quer provar. Por exemplo, a pergunta “Você é a favor da proibição da posse de armas de fogo com o objetivo de reduzir o índice de crimes violentos”?” é uma pergunta tendenciosa porque tende a obter respostas positivas das pessoas preocupadas com crimes violentos”.

“No caso de qualquer alegação estatística, deve-se perguntar como os dados foram obtidos. Às vezes, o simples fato de fazer essa pergunta já indica problemas, especialmente quando o número apresentado é muito preciso. O erro da estatística incognoscível diz respeito à falta de dados que sustentem certas alegações, ou à impossibilidade de acesso a tais dados”.

A questão dada como exemplo “mulheres ganham menos que os homens” já foi discutida em outros artigos que publiquei demonstrando que tal premissa trata-se de uma petição de princípio impossível de ser provada sendo que, não existem dados estatísticos que confirmem a sua validade ou verdade. Conforme o autor Douglas Walton diz, "o erro da estatística incognoscível ocorre quando a impossibilidade prática de colher provas que sustentem a alegação estatística impede que seja feita uma defesa plausível para essa alegação".

Isto posto, quando me deparo com estatísticas enviesadas aplicadas para o setor trabalhista, abro a minha caixa de ferramentas e escolho a Lógica, a melhor das ferramentas para demolir premissas falaciosas, petições de princípio e demais falácias que não se sustentam e não resistem a dois minutos do escrutínio da Lógica. Quando a Lógica entra em cena, gráficos estatísticos desabam restando apenas escombros de más intenções.

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REFERÊNCIA

Walton, Douglas N - Lógica Informal, 2ª edição, 2012, São Paulo, editora WMF Martins Fontes


segunda-feira, 16 de junho de 2025

A Economia a gente vê depois? As questões da Home-Office e do pequeno empreendedor




Quem não se lembra durante o longo período da pandemia dessa perversa frase “fica em casa e a economia a gente vê depois”, proferida por governadores tiranetes e por toda mídia tabajara? Estamos em 2025 e como o mercado de trabalho reagiu a esse “vê depois”? O que estamos vendo hoje? O que mudou nas relações de trabalho? Vejamos:

Durante a pandemia, os empregadores para não sofrerem falência tiveram que adotar diversas estratégias entre as quais, planos de demissão voluntária, férias antecipadas e, sobretudo colocar em prática a modalidade Home-Office. Infelizmente nem todos puderam se utilizar dessa modalidade o que causou uma total quebradeira que acabou atingindo principalmente os pequenos empreendedores tais como, bares, restaurantes, pequenos comércios da periferia, etc. A maioria destes que quebraram nunca mais retornou deixando uma triste lacuna talvez nunca mais recuperável.

Com a migração de funcionários, a maioria do setor administrativo para a modalidade Home-Office, as salas que eram alugadas para os escritórios em edifícios, shoppings e centros comerciais ficaram desocupadas fazendo com que o setor de empreendimentos imobiliários ficasse estagnado causando o encerramento de diversas empresas deste setor e obviamente como consequência a demissão de todos os trabalhadores.

Três anos depois do período pandêmico, podemos dizer que o trabalho pela modalidade Home-Office deu certo? Foi eficaz? O que podemos dizer na situação do momento é que tanto para empregadores bem como para empregados o trabalho remoto revelou na prática vantagens e desvantagens, questão que já abordei em outros artigos.

Na verdade, atualmente alguns empregadores decidiram moderar o trabalho remoto optando pelo retorno do trabalho presencial para alguns departamentos, por exemplo, o financeiro e Recursos Humanos. Ou então três dias da semana em casa e dois na empresa Isto se deve aos pacotes atrativos que as empresas do setor imobiliário estão oferecendo às empresas, tais como, redução do valor do aluguel, isenção de taxas de condomínio e até mesmo como bônus serviços de segurança privada por um período determinado.

Outrossim, podemos perceber que há timidamente um pequeno reaquecimento no mercado de pequenos empreendedores. Estes estão abrindo suas empresas pelas modalidades MEI ou Empresa Individual para atuarem nos setores de produtos artesanais, confeitaria, alimentação, serviços de pequenos transportes, etc.

No entanto, eis que uma nova virose paira no ar: a intervenção estatal alucinada na economia e nos demais setores da sociedade. Tal intervenção se multiplica em vírus intankáveis que atendem pelo nome de impressão de moeda, aumento de impostos, taxações e juros elevadíssimos com a taxa Selic em torno de 15%, além da burocracia infinita para se abrir um pequeno negócio. A economia a gente vê depois? Pois estamos vendo a economia agonizando na UTI, sendo que os únicos antídotos possíveis para reverter esse quadro clínico gravíssimo o governo não está disposto a fabricar: corte de gastos públicos e deixar fluir o livre mercado, sem intervenções brutais e sem burocracias letais.





segunda-feira, 9 de junho de 2025

A Magia do Livro*



Por Herman Hesse

Entre os muitos mundos que o homem não recebeu como um presente da natureza, mas criou a partir de sua própria mente, o mundo dos livros é o maior… Sem a palavra, sem a escrita de livros, não há história, não há conceito de humanidade. E se alguém quiser tentar encerrar em um pequeno espaço, em uma única casa ou um único cômodo, a história do espírito humano e torná-la sua, ele só pode fazer isso na forma de uma coleção de livros [...]

A grande e misteriosa coisa sobre essa experiência de leitura é esta: quanto mais discriminativamente, mais sensivelmente e mais associativamente aprendemos a ler, mais claramente vemos cada pensamento e cada poema em sua singularidade, sua individualidade, em suas limitações precisas e vemos que toda beleza, todo encanto dependem dessa individualidade e singularidade — ao mesmo tempo, percebemos cada vez mais claramente como todas essas centenas de milhares de vozes de nações se esforçam para os mesmos objetivos, invocam os mesmos deuses por nomes diferentes, sonham os mesmos desejos, sofrem as mesmas tristezas. Do tecido mil vezes maior de inúmeras línguas e livros de vários milhares de anos, em instantes extáticos, olha para o leitor uma quimera maravilhosamente nobre e transcendente: o semblante da humanidade, encantado em unidade a partir de mil características contraditórias [...]

Todo leitor verdadeiro poderia, mesmo que nenhum livro novo fosse publicado, passar décadas e séculos estudando, lutando e continuando a se alegrar com o tesouro daqueles que já estão disponíveis [...]

Com todos os povos, a palavra e a escrita são sagradas e mágicas; nomear e escrever eram originalmente operações mágicas, conquistas mágicas da natureza através do espírito, e em todos os lugares o dom da escrita era considerado de origem divina. Com a maioria dos povos, escrever e ler eram artes secretas e sagradas reservadas somente ao sacerdócio. Hoje, tudo isso aparentemente mudou completamente. Hoje, ao que parece, o mundo da escrita e do intelecto está aberto a todos. Hoje, ao que parece, ser capaz de ler e escrever é pouco mais do que ser capaz de respirar. A escrita e o livro aparentemente foram despojados de toda dignidade especial, todo encantamento, toda magia. De um ponto de vista liberal e democrático, isso é progresso e é aceito como algo natural; de outros pontos de vista, no entanto, é uma desvalorização e vulgarização do espírito.

Se hoje a capacidade de ler é a porção de todos, ainda assim, apenas alguns percebem que talismã poderoso foi assim colocado em suas mãos. A criança orgulhosa de seu conhecimento juvenil do alfabeto primeiro alcança para si a leitura de um verso ou ditado, depois a leitura de uma primeira pequena história, um conto de fadas, e enquanto aqueles que não foram chamados parecem aplicar sua capacidade de leitura a reportagens ou às seções de negócios de seus jornais, há alguns que permanecem constantemente enfeitiçados pelo estranho milagre das letras e palavras (que uma vez, com certeza, foram um encantamento e uma fórmula mágica para todos). Destes poucos vêm os leitores. Eles descobrem quando crianças os poucos poemas e histórias... e em vez de virar as costas para essas coisas depois de adquirir a capacidade de ler, eles avançam para o reino dos livros e descobrem passo a passo quão vasto, quão variado e abençoado este mundo é!

Não precisamos temer uma futura eliminação do livro. Pelo contrário, quanto mais certas necessidades de entretenimento e educação forem satisfeitas por meio de outras invenções, mais o livro ganhará de volta em dignidade e autoridade. Pois mesmo a mais infantil intoxicação com o progresso logo será forçada a reconhecer que a escrita e os livros têm uma função que é eterna. Ficará evidente que a formulação em palavras e a transmissão dessas formulações por meio da escrita não são apenas auxílios importantes, mas, na verdade, os únicos meios pelos quais a humanidade pode ter uma história e uma consciência contínua de si mesma [...]

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*Excertos do livro "My Belief: Essays on Life and Art",  Herman Hesse, New York,  publisher Farrar, Straus and Giroux, 1974

segunda-feira, 2 de junho de 2025

As 48 Leis do Poder aplicadas nas relações de trabalho


O livro “As 48 Leis do Poder”, de Robert Greene desde que foi lançado no mercado editorial sempre está no ranking dos mais vendidos. Suas lições são aplicáveis nos negócios, na política, nas relações pessoais e nas relações de trabalho.  Para escrever o livro, Greene pesquisou e compilou ensinamentos, táticas e estratégias de destacadas figuras da história que vão desde Plutarco, Nietzsche, Schopenhauer, Montaigne, Galileu Galilei, La Fontaine, Bob Fischer, Abraham Lincoln, reis, políticos, diplomatas, etc.

Cada uma das 48 leis é ilustrada com casos e acontecimentos reais ao longo da história. Obviamente não concordo com todas, pois algumas delas implicam em ter que abrir mão da conduta ética, ainda que essa condição não esteja explícita, para manipular pessoas na intenção de atingir o resultado esperado.

Tive o cuidado de selecionar seis delas que podemos aplicar nas relações de trabalho sem correr o risco de faltar com a Ética Profissional.

LEI 4 – DIGA SEMPRE MENOS DO QUE O NECESSÁRIO

Quando você procura impressionar as pessoas com palavras, quanto mais você diz, mais comum aparente ser, e menos controle da situação parece ter. Mesmo que você esteja dizendo algo banal, vai parecer original se você o tornar vago, amplo e enigmático. Pessoas poderosas impressionam e intimidam falando pouco. Quanto mais você fala, maior a probabilidade de dizer besteira.

LEI 9 – VENÇA POR SUAS ATITUDES, NÃO DISCUTA

Qualquer triunfo momentâneo que você tenha alcançado discutindo é na verdade uma vitória de Pirro: o ressentimento e a má vontade que você desperta são mais fortes e permanentes do que qualquer mudança momentânea de opinião. É muito mais eficaz fazer os outros concordarem com você por suas atitudes, sem dizer uma palavra. Demonstre, não explique.

LEI 16 – USE A AUSÊNCIA PARA AUMENTAR RESPEITO E A HONRA

Circulação em excesso faz os preços caírem: quanto mais você é visto e escutado, mais comum vai parecer. Se você já se estabeleceu em um grupo, afastando-se temporariamente se tornará uma figura mais comentada, até mais admirada. Você deve saber quando se afastar. Crie valor com a escassez.

LEI 28 – SEJA OUSADO

Inseguro quanto ao que fazer? Não tente! Suas dúvidas e hesitações contaminarão os seus atos. A timidez é perigosa: melhor agir com coragem. Qualquer erro cometido com ousadia é facilmente corrigido com mais ousadia. Todos admiram o corajoso; ninguém louva o tímido.

LEI 34 - SEJA ARISTOCRÁTICO AO SEU PRÓPRIO MODO, HAJA COMO UM REI

A maneira como você se comporta em geral determina como você é tratado: a longo prazo, aparentando ser vulgar ou comum, você fará com que as pessoas o desrespeitem. Pois um rei respeita a si próprio e inspira nos outros o mesmo sentimento. Agindo com realeza e confiança nos seus poderes, você se mostra destinado a usar uma coroa.

LEI 47 – NÃO ULTRAPASSE A META ESTABELECIDA: APRENDA A PARAR

O momento da vitória é quase sempre o mais perigoso. No calor da vitória, a arrogância e o excesso de confiança podem fazer você avançar além de sua meta e, ao ir longe demais, você conquista mais inimigos do que derrota. Não deixe o sucesso subir à cabeça. Nada substitui a estratégia e o planejamento cuidadoso. Fixe a meta e, ao alcança-la, pare.

Bem, apresentei apenas seis leis dentre as quarenta e oito citadas pelo autor que considerei importantes e necessárias no que tange às relações de trabalho, embora o profissional que atua no setor possa se beneficiar de outras mais. Posso garantir por experiência própria que a LEI 4, bem como a LEI 9 funcionam muito bem cujo lema em essência é "falar menos e agir mais", afinal, como sempre tenho dito aqui, falastrões nunca são vistos com bons olhos pela maioria dos empregadores. Quanto ao livro, é altamente recomendável, no entanto devo enfatizar: leia-o com moderação.

segunda-feira, 26 de maio de 2025

Gerente tem que ter postura de líder





A história se repete, dia desses mais um caso de exposição da vida privada de um trabalhador viralizou nas redes sociais. Trata-se de um caso de relação consumerista que envolveu um consumidor, no caso, um sacerdote influencer (seja lá o que isso significa) e um gerente de uma unidade de uma famosa marca multinacional de doces típicos da Argentina. Ocorreu uma divergência de precificação do produto, ou seja, na gôndola constava um preço e na hora de passar no caixa o preço estava mais caro. O sacerdote então reclamou a divergência de preço à luz do CDC (Código de Defesa do Consumidor). Daí seguiu-se uma situação de desinteligência na qual o gerente alheio ao CDC decidiu que o consumidor não tinha razão e manteve o preço mais caro. Resultado, o sacerdote influencer usou a sua rede social como genuflexório confessando a situação para todo planeta enquanto o gerente foi premiado com a demissão.

Bem, de acordo com os artigos 30 e 35 do Código de Defesa do Consumidor-CDC, o sacerdote influencer tinha toda razão de reclamar e estava correto, no entanto, expôs toda a situação em sua rede social. Mesmo que ele não tenha citado o nome do gerente que atendeu a ocorrência, obviamente que os frequentadores do estabelecimento já sabiam de quem se tratava. O sacerdote acabou sendo achincalhado recebendo uma surra de chineladas e bordoadas virtuais pela sua falta de ética em expor um trabalhador. Todos diziam que ao invés de usar sua rede social para expor a situação ele deveria ter reclamado no SAC da empresa. Não iria mudar nada, o gerente teria sido demitido da mesma maneira. Explico em alguns tópicos:

- Trata-se de uma questão corriqueira de divergência de preços entre consumidor/fornecedor que todo gerente tem que estar habilitado para resolver e tomar decisões sem deixar que a situação escale para outras instâncias. Ele é pago para isso! Esse gerente não agiu dessa maneira.

- Todo gerente de loja deve conhecer e dominar profundamente o Código de Defesa do Consumidor justamente para poder tomar decisões justas em casos como esse. Esse gerente ao que me parece desconhece por completo o Código de Defesa do Consumidor, caso conhecesse saberia que o sacerdote influencer tinha razão e teria tomado a decisão correta de manter o preço da gôndola.

- Ainda que o sacerdote influencer ao invés de expor a situação em sua rede social tivesse reclamado da situação diretamente no SAC da empresa, após análise dos fatos o gerente teria sido demitido de qualquer maneira.

- O gerente cometeu pelo menos dois fatos de natureza grave: 1) Não supervisionou a precificação incorreta dos produtos expostos nas gôndolas; 2) Desconhecendo a legislação do Código de Defesa do Consumidor manteve o preço destacado incorreto do produto ignorando o questionamento do sacerdote consumidor. Faltou simpatia, faltou empatia para o consumidor, faltou iniciativa, enfim, faltou gerência.

Mas a cereja do bolo foi quando o próprio gerente após ser demitido também apareceu em suas redes sociais para dar a sua versão dos fatos. Como assim? Sinceramente não acreditei no que vi ali, um gerente reclamão, vitimista e infantilizado despejando cantilenas por ter sido demitido. Isso é postura de gerente? Não, não é, gerente tem que ter postura de gerente, ser firme, assertivo, possuir inteligência emocional, suportar adversidades e se manter em pé, estar preparado para gestão de conflitos e até mesmo estar preparado para ser demitido. Isso sim é postura de um líder.

Espera-se que esse rapaz faça desse episódio um aprendizado que o torne mais forte para enfrentar situações corriqueiras como essa e que a empresa melhore o setor  de recrutamento e seleção no sentido de ter mais acuidade na hora de selecionar um gerente com a expertise profissional adequada à cultura da empresa, bem como, melhore o setor de treinamento e desenvolvimento de seus funcionários. Afinal vivemos um momento em que as redes sociais se transformaram e genuflexórios para a confissão de maldades e pecados.

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Dakh Daughters: Literatura Clássica, Música e Coreografia: a Liderança Compartilhada funciona


Da esquerda para a direita: Natalka Halanevich, Solomiya Melnik, Nina Garenetska, Nataliya Zozul, Tanya Hawryliuk, Anna Nikitina e Ruslana Khazipova


O ano era 2012 na Ucrânia. Sete atrizes e musicistas pertencentes à trupe da Cia do Teatro Dakh de Vanguarda da Ucrânia criaram um projeto cênico inusitado, a formação de um grupo musical/performático denominado Dakh Daughters (Filhas de Dakh) que em pouco tempo se tornaria um dos mais autênticos e criativos fenômenos mundiais das Artes Cênicas. Iniciaram com o espetáculo que batizaram de "Freak Cabaret" com apresentações locais no próprio país dirigidas pelo competente diretor Vladislav Troitsky. As integrantes do grupo tiveram a ideia de adaptar e musicar os versos nº 35 de William Shakespeare (Rozy/Donbass) e subir a performance para a plataforma YouTube e então, voilà: Dakh Daughters da Ucrânia para o mundo num clic do mouse.

As sete atrizes e musicistas integrantes da banda são: Solomiya Melnik, Natalka Halanevich, Ruslana Khazipova, Tanya Hawryliuck, Nina Garenetska, Nataliya Zozul e Anna Nikitina. Além de atrizes, todas (todas as sete!) são multi-instrumentistas, cada uma delas domina vários instrumentos musicais e se revezam nos instrumentos durante as performances. Cantam em vários idiomas (ucraniano, russo, francês, inglês alemão e dialetos ucranianos); versadas em Literatura Clássica e folclore ucraniano, professoras de canto e teoria musical, artes dramáticas e coreógrafas. Duas delas são filólogas e duas são designers. Incrível, não? Bem, elas são polímatas. Para quem não sabe, polímata é uma pessoa que domina diversos campos do conhecimento, estabelece conexão entre eles e coloca em prática algum projeto que resultou da soma desses conhecimentos. Foi exatamente o que elas fizeram.

Vejamos então como funciona a dinâmica da criação e preparação de um projeto do grupo Dakh Daughters: uma das integrantes apresenta os textos de grandes nomes da literatura clássica que pode ser, William Shakespeare, Joseph Brodsky, T.S. Eliot, Mykhail Semenko, Dante Alighiere, Pirandello, etc., e também poesias e contos sobrenaturais do folclore ucraniano; uma ou duas serão as responsáveis por musicar os poemas; outra cuidará do treinamento vocal das integrantes; outra cuidará da coreografia e da performance no palco. O estilo de música utilizado para musicar as peças vai da música de câmera, avant-garde, ópera, folk, jazz, blues, rock, música de cabaret,  hip hop, etc, depende do autor escolhido.

Em cada projeto do grupo, as tarefas são revezadas, ou seja, quem trouxe o texto poderá ser a responsável pela música num próximo projeto; quem cuidou da coreografia poderá ser a responsável pelos textos e assim sucessivamente. Não existe no grupo função fixa ou mesmo uma líder no comando. Temos aqui um exemplo bem raro de liderança compartilhada e que neste caso das Dahk Daughters funciona muito bem. Todas elas de certa maneira lideram a cada espetáculo. A incrível reciprocidade e interesse das sete integrantes em diversos campos do conhecimento dos quais todas elas dominam e compartilham é um ponto a ser considerado. E neste caso temos que reconhecer que juntar sete pessoas com essas habilidades em comum e ainda construir um projeto artístico não é algo que encontramos por aí a todo momento. Isso explica porque as Dakh Daughters é um grupo musical e performático único, longevo e sem similar que surgiu nas últimas décadas.

Em 2022 quando a Rússia invadiu a Ucrânia, uma companhia de teatro francês convidou imediatamente o grupo para se mudar para França, país no qual elas residem até hoje desde então. Infelizmente duas delas não puderam vir e hoje o grupo conta com cinco integrantes originais que se dedicam à causa pelo fim da guerra na Ucrânia. Em setembro de 2019 estiveram no Brasil numa única apresentação no Theatro São Pedro em Porto Alegre. A banda tem quatro álbuns gravados, If (2016), Air (2019),  Make Up (2021) e acaba de sair do forno o novo álbum Pandora's Box já disponível nas plataformas digitais.

A agenda do grupo já está praticamente cheia para o ano de 2025 com a apresentação da peça Danse Macabre e a divulgação do novo álbum Pandora's Box. Mas elas não param por aí, são workaholics, continuam estudando literatura clássica e aprendendo a tocar novos instrumentos, dão aulas de canto, dança, teoria musical, expressão corporal, idiomas e ainda atuam como atrizes em diversas outras peças. A lição que as Dakh Daughters nos ensina é que a Liderança Compartilhada funciona muito bem.

A Liderança Compartilhada é uma tendência que está se consolidando nas  empresas em diversos países desenvolvidos ao redor do mundo porque ela entrega resultados surpreendentes. Entretanto, fica claro que para que os resultados sejam satisfatórios, alguns elementos devem estar presentes: todos os envolvidos num estilo de liderança compartilhada devem estar permanentemente em sintonia, possuir interesses recíprocos, lealdade, confiança, comprometimento e sobretudo a admiração e respeito pelo trabalho de seus pares. Na Liderança Compartilhada todos brilham tal como as integrantes da Dakh Daughters Band.






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