segunda-feira, 18 de março de 2024

Falar bem ou ter boa oratória é “combustível” para alavancar carreira?


"Fazemos bem aquilo que gostamos de fazer" (Napoleon Hill)

Dia desses tive a oportunidade de assistir um curioso podcast no qual duas especialistas em oratória, uma delas advogada e a outra fonoaudióloga discorriam sobre as habilidades de se falar bem. Até aí nada contra, no entanto num certo momento da conversa o tema enveredou para o setor de gestão de pessoas e uma das especialistas disse peremptoriamente que "a oratória é o combustível para alavancar carreira". Oi? A outra especialista por sua vez disse que se o candidato tiver uma boa oratória na entrevista de seleção é possível saber tudo sobre as suas habilidades. Será? Bom, não é bem assim. Aos fatos:

É importante aqui que antes saibamos a diferença entre Oratória e Retórica. Oratória é a habilidade de comunicar com clareza, elegância e confiança todo o discurso que foi construído pela retórica; já a Retórica é a construção de bons argumentos levando-se em conta os aspectos racionais e emocionais. Parece simples, porém na prática nem todos conseguem obter feedback positivo na sua maneira de se comunicar por desconhecer as regras linguísticas de se comunicar bem.

Retornando às afirmações das duas especialistas, considero bastante preocupantes afirmações deste teor, isto porque na prática não é assim que acontece. Com toda certeza se uma das duas fosse profissional de RH não colocaria as questões da maneira como foram colocadas. Parece-me que nenhuma delas tem a mínima noção da dinâmica ou de como funciona um processo de recrutamento e seleção.

Quando uma vaga é aberta, o responsável pelo setor de recrutamento e seleção recebe um formulário enviado pelo gestor do departamento no qual a vaga foi aberta, cujo formulário constará todo o perfil que o candidato deverá possuir para o preenchimento da vaga. Já recebi formulário (e não foi uma vez só!) que constava que uma das caraterísticas que o candidato deveria ter é que fosse introvertido e falasse pouco. Se fosse muito comunicativo, nem pensar! Pois é.

Obviamente que a exigência para que o candidato tenha habilidade em se expressar e se comunicar muito bem está restrita a alguns cargos, sobretudo os de gerência, gestão ou supervisão cujas funções no dia a dia requerem que estejam em contato com clientes, fornecedores e subordinados. Podemos citar também assessores de comunicação, secretárias, relações públicas, vendedores e naturalmente outros cargos cuja expertise na função seja justamente a habilidade de se comunicar bem.

Outra questão que uma das duas levantou foi que qualquer pessoa pode desenvolver habilidades em oratória. Depende. Existe uma característica do ser humano denominada vocação e que não pode ser descartada. Pessoas com tendência a ter uma voz potente do tipo locutor de rádio ajuda bastante. As chances de essas pessoas escolherem uma profissão que requer uma boa comunicação são muito mais sólidas do que aquelas sem vocação que gastaram rios de dinheiro em cursos de oratória sendo que elas poderiam empregar esse investimento em outras habilidades inerentes às suas vocações. Napoleon Hill sempre discorria sobre a importância da vocação em seus livros.

É bom lembrar aqui que bons resultados apresentados na execução de tarefas, bem como, o fator produtividade são muito mais importantes do que ter uma boa oratória. E de novo, dependendo do cargo, entre um funcionário que se comunica bem, porém é ineficiente em apresentar resultados e outro que não se comunica bem, mas apresenta resultados satisfatórios as chances de promoção e decolar na carreira estão muito mais próximas deste último. Funcionários falastrões nem sempre são bem vistos, depende muito da cultura da empresa.

Além disso, pessoas que possuem um raciocínio lógico aguçado ou tiveram algum contato com a disciplina denominada Lógica (ramo da Filosofia que distingue o pensamento correto do incorreto através de premissas), conseguem muito mais êxito quando se comunicam do que aquelas que se prendem apenas em ser bons oradores.

Isto posto, de nada adianta ter voz de trovão ou de locutor de rádio, de nada adianta investir dinheiro em cursos oportunistas que prometem que a pessoa sairá do curso falando como o filósofo Marco Túlio Cícero ou Demóstenes. Isso não é combustível suficiente (suficiente!!) para alavancar carreira de maneira alguma. Dominar a língua pátria, falar o português correto, saber e dominar as regras da Lógica, do raciocínio correto, daí sim, mais de meio caminho estará percorrido para se fazer compreender e ser compreendido, seja na vida pessoal, social ou profissional. O resto é lábia para vender curso oportunista engana trouxas, é puro bla bla bla sofístico que não resiste a três minutos de raciocínio lógico, é combustível batizado que deixará a pessoa a pé e no meio do caminho.


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