segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Carta de Referência não serve para nada, papel aceita qualquer coisa


Novamente trago em pauta um tema que já escrevi a respeito recentemente nesse artigo. É inacreditável como muitas empresas (leia-se gestores do RH dessas empresas) ainda insistem em exigir do candidato a carta de referência, sabendo que a maioria das empresas não as fornecem, nem sob tortura. E caso o candidato não a consiga, a vaga já era!

A exigência dessa carta é uma das maiores imbecilidades e incoerências que conheço nos meus anos atuando em RH. Há outros meios de se obter referências do contratado que não seja a carta de referência que, para mim, não diz nada, absolutamente nada. Afinal, uma folha de papel aceita que se escreva qualquer baboseira sobre ela.

Continuo recebendo uma quantidade considerável de consultas de pessoas que perderam a vaga em razão de não terem conseguido a carta de referência. A possibilidade de demandar a empresa na justiça é uma alternativa que nem sempre resulta em sucesso, assunto que já abordei no artigo que escrevi a respeito. Vamos então considerar a questão através de outra perspectiva:

Ora, o candidato foi chamado para uma primeira entrevista de triagem. Passou para a próxima etapa em que irá fazer dinâmica de grupo. Passou para próxima fase dos testes técnicos e em algumas empresas passará por testes psicológicos (ainda existe quem acredita nessa bobagem) também. Passou por todas as fases e ainda terá a entrevista final com a pessoa que será o seu supervisor imediato. O supervisor dá a sua anuência ao RH para a contratação do candidato. Só que não!! Uma cavalgadura infeliz do RH vai solicitar ao candidato a famigerada carta de referência! Faz algum sentido?

Recapitulando: o candidato passou por uma primeira entrevista, dinâmica de grupo, testes técnicos e psicológicos (oi?) e entrevista final com o supervisor que já acenou com o sim para a contratação. São cinco fases (ou mais em alguns casos) que poderá durar dias. O candidato superou todas, no entanto a falta de uma folha de papel poderá por tudo a perder. Será que esse papel é mais importante do que as cinco fases que o candidato superou com determinação? Vejamos:

O que é uma carta de referência? É uma folha de papel ofício com algumas linhas digitadas e que não quer dizer muita coisa a não ser “nada consta”. Ou será que existe carta de referência com o carimbo “tudo consta de ruim na vida dessa pessoa”? Seria uma carta de referência negativa? Alguma empresa se arriscaria a fazê-lo e depois ter que responder na justiça por danos morais e materiais e por óbice na obtenção de emprego? Eu creio que não.

Conheço muita gente mau caráter que tem carta de referência e também de recomendação para todos os gostos, sabe-se lá de que maneira essa gente as obteve; enquanto trabalhadores honestos não conseguiram, não porque não mereciam, mas simplesmente em razão de ser política da empresa não fornecer carta de referência para ninguém. Ainda que a empresa a forneça, não há garantia alguma que o que está ali escrito seja sincero ou verdadeiro. A empresa fornece a carta por mera formalidade.

Naturalmente que se tratar de cargo de confiança no qual o funcionário irá manipular valores, movimentar conta corrente, aplicações, etc, é normal que o candidato a apresente na ocasião da contratação. Ainda assim, do meu ponto de vista, desnecessária. Porém, fora desse contexto é absolutamente bizarra a solicitação da carta de referência ou de recomendação. 

E mais, normalmente são justamente as empresas que exigem carta de referência como condição “sine qua non” para a obtenção da vaga, que não as fornecem de maneira alguma para ex-funcionários. Coisa dos miolos de mingau das antas que habitam os departamentos de RH dessas empresas.

Judicialmente, a quem demandar? A empresa que negou de fornecer ou a empresa que a exigiu? A que negou não tem obrigação de fornecer, não há lei que discipline a questão, salvo determinação em acordo coletivo; a que exigiu tem o direito de exigir, embora seja tamanha falta de bom senso e imbecilidade do gerente de RH. O candidato fica no meio do fogo cruzado e sempre acaba sendo atingindo com a perda da vaga.

E será que perante à justiça a empresa que deixou de contratar vai confessar que o motivo foi a falta da carta de referência? Nunca! Jamais! Outros motivos serão alegados, motivos é que não faltam, toda empresa tem uma coleção deles em estoque.

Já vou avisando: o Estado não tem que se imiscuir nessa questão e sacramentar alguma lei de calada de noite obrigando as empresas a forneceram uma carta de referência. Isso é questão para ser tratada em acordo coletivo e olhe lá. É de bom senso das partes das empresas e profissionais do RH que disponham a questão em Regulamento Interno.

No mais, sugiro então que o recrutador seja franco antes da primeira entrevista e já pergunte ao candidato: você tem carta de referência? Caso não seja possível, não fará o candidato de palhaço fazendo-o passar e superar as várias fases do processo de seleção para no fim premiá-lo com a perda da vaga pela falta da carta de referência.

Melhor ainda, se esse papel é tão mais importante do que as várias fases de um processo de recrutamento e seleção, que, diga-se de passagem, custa bem caro, desde os anúncios em jornais, contratos com agências de emprego, salários do pessoal de RH, que se extinguam então os departamentos de Recrutamento e Seleção das empresas, uma vez que a carta de referência vale mais do que todo o processo, esse departamento não tem mais razão de existir.


segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Filme recomendado: Jogo de Espiões (Robert Redford e Brad Pitt)


Entre inúmeros filmes que Redford foi o protagonista sempre em grande estilo, este blog escolheu para homenageá-lo o filme "Jogo de Espiões, um clássico do gênero ação/espionagem". Outro filme que aborda a relação às vezes muito complicada entre mestre e pupilo. No entanto, o personagem de Redford (o agente da CIA Nathan Muir) nos entrega lições de ética, inteligência, sagacidade, redenção e amizade incondicional para com seu ex-pupilo Bishop. Há muitos anos não mais se econtraram após severa divergência entre eles pelo método muito questionável que Muir conduzia as missões. Ainda assim, Muir utilizou de toda sua experiência para libertar da prisão chinesa o ex-pupilo.

Jogo de Espiões é mais uma obra prima dirigida com brilhantismo pelo saudoso mestre Tony Scott. O filme tem como protagonistas, Robert Redford (Nathan Muir) e Brad Pitt (Tom Bishop). Redford em uma de suas mais brilhantes performances é um agente da CIA em seu último dia de trabalho e Pitt é seu ex-pupilo que encontra-se detido numa prisão na China.

Lançado em 2001, tornou-se um clássico no gênero, mais do que um filme espetacular de ação e suspense de tirar o fôlego, o diretor foca no personagem Nathan Muir (Redford) que nos dará formidáveis lições de lealdade, inteligência, sagacidade, amizade e redenção. 

Num passado remoto, Muir recruta Bishop, um exímio atirador que havia se apresentado como voluntário. Muir fica impressionado com a determinação e as habilidades de Bishop e resolve treiná-lo para as missões mais obscuras da CIA. Podemos dizer que Muir se sentia quase um pai para Bishop e disso resultou uma cumplicidade fraterna.

Muir começou a passar missões para Bishop e dava ordens que Bishop não estava de acordo. Chegaram a discutir algumas vezes pelos métodos muito violentos e nada ortodoxos determinados por Muir. Bishop então se afasta de Muir. Porém, algum tempo depois, uma missão em Beirute para eliminar um perigoso terrorista coloca Muir e Bishop novamente juntos. Os dois saem para tomar um café e Bishop dá um presente de aniversário para Muir. É uma garrafinha portátil de bebida que Bishop confiscou numa operação chamada “jantar fora” ("jantar fora", guarde bem essa expressão!).Muir disse a Bishop que ia se lembrar disso.


Acontece que Bishop (disfarçado de fotógrafo) conhece no campo de feridos uma enfermeira voluntária, Elizabeth Hadley (interpretada pela atriz Catherine McCormack). Na verdade, Elizabeth é uma ex-ativista política britânica, porém ela não revela esse fato a Bishop e nem Bishop revela que está em missão pela CIA. Os dois se envolvem e têm um romance. Muir levanta a vida de Elizabeth e revela a Bishop que ela é uma perigosa ativista que participou de atentado em Londres e que resultou na morte do filho de um ministro chinês. Era verdade. Muir e Bishop discutem novamente. Após a missão cumprida em Beirute com a morte do terrorista numa exagerada operação comandada por Muir, os dois agentes rompem a amizade definitivamente para nunca mais se encontrarem. Nesse dia, Bishop retorna ao apartamento de Elizabeth e o encontra vazio. Um bilhete (forjado por Muir) escrito por ela revelando que realmente ela era uma ativista perigosa. Sem Bishop saber de nada, Muir entrega Elizabeth para os chineses em troca de um diplomata que estava capturado. Elizabeth pega prisão perpétua na China.

Muitos anos se passam e no último dia de trabalho de Muir na CIA ele é informado que seu antigo pupilo foi capturado na China e ia ser executado no dia seguinte. Bishop conseguiu rastrear Elizabeth e tentou resgatá-la (isso passa logo no início do filme) numa operação mal sucedida e acabou sendo preso. Os chefões da CIA questionam Muir sobre o que Bishop foi fazer na China. Muir disse que não fazia ideia (mas é claro que sabia!) e nunca mais teve contato com ele. Como não era uma missão autorizada, a CIA lava as mãos e não vai salvar Bishop. Bishop seria executado logo ao amanhecer. Muir é colocado como suspeito e é investigado por um comitê de investigadores. Ele não poderá mais sair do prédio até que esclareça as suas missões com Bishop.

É a partir daí que Muir entra em ação para salvar Bishop sem a CIA saber. O plano que Muir elabora é uma verdadeira lição de criatividade, sagacidade e ousadia. Dentro das dependências da CIA, Muir passa a noite forjando documentos, invadindo salas, telefonando para amigos, falsificando assinatura do diretor da CIA até que ele consegue um contato na China através de um amigo. A operação para livrar Bishop não vai sair barato, vai custar 500 mil dólares! Aonde Muir vai conseguir esse valor? Sim, ele vai usar de sua própria conta bancária, economias que ele juntou ao longo dos anos.

Enquanto isso, ao mesmo tempo, Muir responde impassível com firmeza e muita frieza as perguntas dos investigadores. Ele conta superficialmente sobe a relação de Bishop com Elizabeth, dando poucos detalhes. Por fim, ele fingiu também estar de acordo com o lavar de mãos da CIA para não libertar Bishop, pois foi uma missão não autorizada. Muir então é liberado, mas antes um investigador lhe faz uma última pergunta, o que considero uma dos pontos altos do filme. O investigador lhe pergunta que se ele soubesse que Bishop foi à China a fim de libertar Elizabeth, se ele contaria isso a seus superiores. Muir demora a responder, olha fixo para um ponto qualquer da sala e responde, NÃO! Reflita bem sobre esse “não”, pois isso já valeria o filme.

Nesse mesmo momento, enquanto Muir já havia saído do prédio da CIA, a operação para resgatar Bishop e também Elizabeth está em curso. Um blackout total é provocado no presídio e finalmente Bishop e Elizabeth são resgatados por soldados americanos. E aqui é o que considero o outro ponto alto do filme. O piloto do helicóptero comunica pelo rádio que a missão “jantar fora!” foi cumprida. Bishop escuta e pede para o piloto repetir o que disse. E o piloto repete, “operação jantar fora, senhor”. Impossível não se arrepiar.

Além das lições de inteligência, sagacidade e lealdade ao antigo pupilo que o personagem de Muir nos passa, a maior lição que fica é que sempre há tempo para se redimir de um erro cometido no passado e na maioria das vezes,  o erro nunca sai barato. Mas Muir se redimiu,  (ainda que Bishop estivesse a milhas de distância), com muita inteligência, inabalável, estoico sob a pressão da comissão que o investigava, e como num jogo de xadrez, Muir jogando na defesa com as peças pretas acabou dando um xeque-mate numa jogada de mestre!


segunda-feira, 22 de setembro de 2025

No trabalho do Freelancer não pode haver relação de subordinação



Tenho recebido um volume razoável de dúvidas de Freelancers que atuam no mercado de trabalho. Tais dúvidas se traduzem principalmente em reclamações pela dificuldade em receber seus honorários das empresas para as quais prestam seus serviços. Além disso, alguns têm de cumprir ordens e prazos mantendo uma relação de subordinação o que descaracteriza a condição de Freelancer. Vejamos:

Não existe legislação que regulamente a condição de Freelancer, ainda bem! Freelancer (ou “frila”, como são conhecidos no Brasil) é um termo em inglês que define um profissional autônomo que presta serviços e desenvolve projetos para diversas empresas de maneira totalmente independente, ou seja, não há o vínculo empregatício e, portanto não deve haver subordinação de maneira alguma.

É constante a atuação do Freelancer na maioria das empresas de comunicação, quer seja como articulista, revisor, redator, repórter fotográfico, diagramador, webdesigner, tradutor, ilustrador, etc. No entanto, atualmente profissionais de outras áreas também vêem vantagem e atuar como “frila”, tais como, arquitetos, contadores, engenheiros, profissionais de RH entre tantos outros que podem ser profissionais liberais ou não.

Um profissional de TI escreveu durante um ano aproximadamente artigos sobre informática para uma revista especializada. Recebeu os três primeiros artigos e depois a empresa não mais o pagou pelo restante dos artigos. Não foi elaborado um contrato expresso (imprescindível!) entre as partes, apenas tácito. Ele tinha prazo e era cobrado para entrega dos artigos; era estipulado um número “x” de caracteres rigorosamente e teve artigos mutilados e alterados pela empresa. Como podemos observar, havia uma relação de subordinação. Vejamos então o que diz sobre essa matéria o saudoso jurista e meu ex-professor Dr. José Serson:

“Trabalho subordinado”. O autônomo se distingue do empregado por ser autor de suas determinações, dono de si mesmo, livre de injunções disciplinares. Ele trabalha quando, quanto e como quer. É comum dizer-se:

    a) é subordinado quem tem hora de entrada e saída obrigatória; mesmo que originalmente fixados pelo próprio trabalhador;

 b) é subordinado quem recebe repreensão, advertência, suspensão, ou qualquer outra forma de reprimenda, mesmo verbal, pois significam enquadramento em disciplina; e

 c) é subordinado quem recebe ordens de fazer ou deixar de fazer (incluindo roteiros, itinerários, convocação para reuniões, uso de uniformes); elas se distinguem das ordens de como proceder, que são diretrizes técnicas. O autônomo não está obrigado a trabalhar quando não quiser, e quando bem entender pode parar (qualquer interferência da empresa nessa matéria elimina a autonomia); entretanto, ao trabalhar, deve ater-se às normas operacionais adotadas pela empresa, sob pena de tornar impossível a vinculação de interesses. Não se pode exigir, assim, o chamado relatório físico (onde estive, com quem conversei, quando cheguei e quando saí, ou seja, relatório sobre a pessoa do trabalhador), mas apenas relatório técnico (sobre a mercadoria ou mercado).

A subordinação leva a se reconhecer a relação de emprego mesmo quando o trabalhador tenha matrícula de autônomo no INSS, pague a municipalidade como autônomo, e se tenha inscrito nessa qualidade em órgão de fiscalização profissional (como por exemplo, o conselho de representantes comerciais e autônomos).”

Vimos então que o fator subordinação é elemento crucial que descaracteriza a condição de autônomo gerando automaticamente o vínculo empregatício. E neste caso, o profissional deverá reunir as provas documentais, testemunhas e ajuizar ação trabalhista para pleitear o vínculo empregatício.

Entretanto, quando não existir nenhum tipo de subordinação de relação de trabalho, caso o “frila” não esteja recebendo os devidos honorários determinados em contrato pela prestação de seus serviços, o caso deverá ser resolvido fora da esfera trabalhista. O profissional deverá entrar com ação de cobrança na justiça comum sempre observando o prazo de prescrição da dívida que, no caso de freelancers, profissionais liberais e autônomos em geral é de 5 anos conforme artigo 206, § 5º, inciso II do Código Civil.

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Teste Rorschach (borrões de tinta) é ineficaz nas entrevistas de seleção



Muitos candidatos nas entrevistas de seleção já passaram pelo teste Rorschach, dependendo do cargo pretendido. O teste consiste em olhar para figuras representadas por manchas ou borrões de tinta e responder ao entrevistador o que o candidato enxerga em cada uma delas. É como a pareidolia em que as pessoas enxergam rostos, vultos e figuras em nuvens, montanhas, etc. Algumas empresas ainda insistem nesse teste para avaliação das aptidões dos candidatos. Mas será que o teste Rorschach realmente funciona? Vejamos um pouco de história.

O teste foi criado (não tão criado assim) pelo psicólogo suíço Hermann Rorschach (1884-1922). Quando jovem, Hermann era fissurado num jogo chamado Kleksographie. O jogo consiste na arte de criar imagens a partir de manchas de tinta e foi criado (acidentalmente, diga-se de passagem) pelo escritor e poeta alemão Justinus Kerner. Rorschach então decidiu (pasmem!) que essa técnica poderia ser utilizada no campo clínico para avaliação das mais diversas personalidades de pacientes com problemas mentais.

Ocorre que o pedagogo e psicólogo francês Alfred Binet (1857-1911)  o precursor do teste de QI, já estava trabalhando com manchas de tintas para avaliação da inteligência humana. Além de Binet, em 1896 nos Estados Unidos, apareceu um outro jogo descrito por Albert Paine & Ruth McEnery Stuart, denominado Gobolinks que consistia em como fazer monstros com borrões de tinta e usá-los em versos criativos. Como podemos observar, Rorschach não foi o pioneiro nos borrões de tinta como muita gente imagina.

O teste dos borrões de tinta (são 10 pranchas com borrões diferentes) obviamente requer um método de codificação e interpretação para avaliação. Hermann Rorschach faleceu prematuramente antes que pudesse elaborar um método de codificação para o seu próprio teste. O seu falecimento ocorreu justamente quando o seu livro com as pranchas das tintas estavam praticamente impressos. A venda do livro foi um tremendo fracasso uma vez que não havia uma explicação clara sobre o propósito daquelas pranchas com borrões aleatórios.

Após o falecimento de Rorschach, vários pesquisadores e psicólogos se debruçaram sobre a questão e desenvolveram os mais diversos métodos de codificação e interpretação do teste. Atualmente os dois sistemas mais utilizados são: o sistema de Exner (John E. Exner) e o sistema de Bhom (Ewald Bohm). Existem muitos outros e assim sendo, podemos concluir que não há consenso sobre um método preciso e adequado de codificação e interpretação.

Vejamos agora, grosso modo, alguns dos principais traços característicos que o teste Rorschach pretende avaliar:


- A quantidade de inteligência

- A qualidade de inteligência

- Afetividade

- Atitudes Gerais

- Humor

- Traços Neuróticos


A aplicação dos testes é utilizada nos campos jurídico-forense, clínico, educacional, organizacional, etc. Devem ser aplicados apenas por psicólogos habilitados e treinados no teste conforme determinação e critério do Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos-SATEPSI. No Brasil foi introduzido no ano de 1927 pelo médico Ulisses Pernambuco com a contribuição da psicóloga russa Helena Antipoff e do psiquiatra José Lemes Lopes.

Já escrevi em diversos artigos sobre testes de inteligência nas entrevistas. A comunidade científica refuta com veemência testes de aferição da inteligência como por exemplo os testes de QI pela falta de precisão, afinal, de acordo com a comunidade não existe medida científica para a inteligência. Assim sendo, não poderia ser diferente com o teste Rorschach com suas imprecisões e diversos métodos de codificação ao redor do mundo.

O que nós vemos num borrão de tinta? Vemos um borrão de tinta, oras! Outra resposta diferente dessa vai depender muito da subjetividade de quem faz a pergunta e não há como fugir disso. A possibilidade de forjar ou manipular os resultados, bem como, as respostas é infinita ao gosto de quem aplica o teste.

Quem já pesquisou o mínimo sobre História da Arte da qual a arte abstrata faz parte, sabe muito bem que de nada adianta perguntar ao artista pintor que criou uma pintura abstrata o que significa aquelas manchas ou borrões. A pintura abstrata é apenas uma composição de cores e traços que o artista criou até chegar num visual belo e agradável de se ver e puramente decorativo sem nenhuma teoria mirabolante por trás a respeito do que ele quis transmitir com sua arte.

Portanto, o teste Rorschach é análogo  à pareidolia, algo para lá de ridículo se levado a sério numa entrevista de seleção de pessoas para avaliar aptidões. Como entretenimento lúdico, propósito pelo qual foi criado em sua origem, pode até ser divertido num happy hour, brincar numa roda de amigos de enxergar figuras aonde elas não existem, sobretudo quando começamos a enxergar bailarinas e sereias sorrindo e dançando no líquido etílico dentro do copo que já comporta  a quinta ou sexta dose de whisky barato.


segunda-feira, 8 de setembro de 2025

À Altura (The Match): filme recomendado que aborda a difícil relação entre mestre e aluno




"Não importa olhar um para o outro, mas ambos olharem na mesma direção, para frente e mais para o alto" (Saint-Exupéry)


À Altura (The Match) está sendo considerado como um dos melhores filmes do gênero drama lançados esse ano pela Netflix.  Baseado em fatos reais, o filme conta a história dos dois maiores campeões nacionais e internacionais de “Go”, respectivamente, Cho Hun-hyun e seu aluno e futuro campeão, Lee Chang-ho, ambos sul-coreanos. Go é um complexo jogo de tabuleiro criado na China há mais de 2.500 anos sendo provavelmente o jogo mais antigo do mundo e que trata do cerco e domínio de territórios representados no tabuleiro por peças brancas e pretas.

Os protagonistas dão um show de interpretação, o professor e campeão Cho é interpretado pelo talentoso ator Lee Byung-hun e seu aluno Lee é interpretado por Yoo Ah-in (já adulto) e Kim Kang-hoon (garoto), ambos atuam magistralmente. A semelhança física com os campeões reais é impressionante. A direção é do competente cineasta e roteirista Kim Hyeong-ju, conhecido por alcançar resultados surpreendentes ainda que sempre trabalhe com baixo orçamento. Destaca-se também o cenário e a fotografia impecáveis da ambientação do filme na década de 80 ocasião em que se deu o encontro entre mestre e aluno.

Cho, após vencer mais um campeonato conhece um garoto (Lee) prodígio que costuma jogar GO nas praças da cidade e vencer todas as partidas disputadas ao mesmo tempo com diversos jogadores. Cho o observa jogar, reconhece que o garoto tem enorme talento, provavelmente vê nele um futuro campeão de Go, porém o garoto precisa de mais sutileza e treinamento apesar de jogar muito bem. Cho lhe faz um convite para treiná-lo em sua casa. Lee então, feliz da vida, aceita o convite e se muda para a casa do campeão e mestre Cho.

A relação entre mestre e aluno é bastante conflitante. Cho é duríssimo e implacável com Lee nas lições que compreendem as aberturas, ataques e defesas das partidas. Lee é admitido no clube de Go da cidade e vai ganhando todas as partidas que disputa, não há páreo para ele a não ser o seu mestre Cho que sempre demonstra insatisfação com o estilo de jogo de seu pupilo. 

O tempo passa e Lee desenvolve secretamente o seu próprio estilo de jogo, estilo esse que seu mestre Cho não aprova por julgar falta de sutileza e de classe. Até que chega o dia da disputa do campeonato oficial no qual o campeão Cho terá que enfrentar o segundo jogador no ranking que é nada mais nada menos do que seu aluno Lee. É uma partida tensa, angustiante que leva quase um dia, pois dois gigantes estão disputando o campeonato mundial. Cho perde a partida para o seu aluno Lee que se sagra campeão. Lee não se empolga, muito menos comemora a vitória para o espanto dos repórteres e fotógrafos presente que acompanharam a partida.

É a partir desse ponto que o drama vai se desenrolar, pois a vitória de Lee causará mudanças nas personalidades de mestre e aluno. Lee deixa a casa de Cho e retorna para a casa de seus pais. Ele se torna um sujeito apático e melancólico enquanto Cho não consegue digerir a derrota para o ex-aluno. Até que Cho encontra um jogador de Go, Nam (Jo Woo-jin) seu ex rival de inúmeras partidas e que fará com que Cho resgate o campeão e grande mestre que ele é. Cho e Lee se encontrarão novamente para uma outra disputa de campeonato.

Bem, apesar de muitos que assistiram o filme tenham reprovado as lições duras e implacáveis que Cho impunha a seu aluno, o mestre enfim entendeu que as suas duras lições fizeram com que Lee acabasse criando o seu próprio estilo de jogo diferente de seu mestre. Mas como nos ensinou o filósofo Sócrates, não é esse mesmo o papel do mestre? Forjar o aluno para que descubra o seu próprio caminho e estilo para um dia então deixar de ser aluno e se tornar também um mestre? Entendo que Cho cumpriu o seu papel  magistralmente e com muita maestria fazendo com que Lee se tornasse um mestre de GO e campeão absoluto por anos consecutivos tal como Cho, o seu mestre. Leonardo da Vinci que foi um grande mestre sabiamente escreveu em seus cadernos de anotações:

"Triste discípulo aquele que não se esforça para ultrapassar seu mestre; e é um triste mestre aquele que se indigna de ver seus discípulos preocupados em ultrapassá-los".

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

O Jazz sempre tem algo a ensinar sobre liderança compartilhada




A organização que improvisa*

Por Frank. J. Barrett**

Como seria uma organização que procurasse aprender com bandas de jazz? Os gerentes, para começo de conversa, teriam grande respeito pelas estratégias emergentes e teriam o cuidado de não separar aqueles que estão formulando a estratégia dos responsáveis pela sua implementação, porque a ação cria o feedback que fundamenta o próximo passo. Para isso, a alta gerência estaria com a mão na massa, aprendendo sobre as mudanças no ambiente e obtendo regularmente experiência prática e concreta.

A organização que improvisa criaria estruturas fluidas que se formam, se dissolvem e voltam a formar à medida que surgem novas situações e novos desafios. Grupos d projeto não seriam formados como resultado de sessões de de planejamento abstratas a priori, mas sim à medida que as situações exigissem. Grupos seriam formados e dissolvidos, reunidos para abordar determinados assuntos e servir a funções específicas e, em seguida, seriam dissolvidos.

A estratégia seria criada de forma retrospectiva, à medida que as pessoas experimentassem algo, formassem grupos para discutir a questão e, em seguida, articulassem qual seria a estratégia. Pessoas de diferentes áreas funcionais conversariam regularmente, compartilhariam insights e expertise de acordo com o que a situação exigisse. Expressões de espanto seriam comuns quando surgissem insights de lugares improváveis em momentos imprevisíveis e à medida que os empregados chegassem a novos acordos por meio de processos colaborativos.

As organizações criariam diretrizes mínimas, permitindo que os empregados se orientassem para situações concretas e seguissem seus palpites, dando contribuições necessárias. A energia oscilaria, à medida que indivíduos e grupos seguissem suas paixões ou reagissem a um desfio adaptativo. Haveria uma noção de descoberta comum à medida que as pessoas deparassem com situações de difícil solução, explorassem ideias e considerassem opções, descobrissem novas possibilidades apenas depois de ações experimentais já terem sido iniciadas. Mandatos de cima para baixo seriam recebidos com desconfiança, ou até mesmo ignorados, por medo de que pudessem atrapalhar as negociações de baixo para cima e os processos de análise.

Em vez de ficarem isolados em seus estilos, os funcionários trabalhariam em vários projetos ao mesmo tempo e pertenceriam a diversas equipes. Conversas e interações entre os silos criariam um modo de diálogo fundamentado na curiosidade. Perguntas surgiriam: De onde vem isso? Como você descobriu aquilo? Por que sou o único que não sabia disso? Por que não percebemos isso antes? Por que? Não porque todos quisessem bancar os especialistas, mas porque os empregados nunca estariam muito satisfeitos com o que sabem, nunca completamente confiantes de que estariam preparados para o que acontecesse a seguir.

Já que significados e cenários seriam fluidos, as pessoas utilizariam menos a clareza cognitiva e ficariam mais à vontade com a incerteza e a ambiguidade. Seria mais fácil admitir o que você não sabe e sentir livre para buscar a ajuda dos outros para obter informações; seria mais fácil também assumir qualquer papel solicitado quando surgisse a necessidade. Uma cadeia hoteleira que quisesse enfatizar o serviço quatro estrelas, em que todos os empregados seriam responsáveis por deleitar o cliente, se livrou de todos os títulos dos cargos. Todos os funcionários passaram a ser, a partir de então, “associados”, e era igualmente esperado d todos que respondessem aos pedidos independentemente de fazerem parte das exigências de departamentos específicos.

Assim seria uma organização que improvisa. Na Roadway Trucking, onde os empregados da linha de frente participam ativamente do planejamento estratégico, os motoristas de caminhão não esperaram ter aprovação para usar o celular para comunicar informações importantes sobre as remessas de carga e horários de entrega. Ao contrário, tomaram a iniciativa de comprar celulares e começaram a usá-los para demonstrar que esse importante recurso deveria ser financiado pelo departamento.

“Todos fazem de tudo” – esse é um bom lema para bandas de jazz e para organizações que querem aprender a improvisar. As apresentações de jazz não são aleatórias nem acidentais. Os músicos se preparam para serem espontâneos, afinal como dizia o lendário baixista de jazz, Charles Mingus, “ninguém improvisa do nada”.

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*Excertos adaptados do capítulo 8 do livro, "Sim à Desordem, de Frank J. Barrett, editora Elsevier, 2013, Rio de Janeiro

**Frank J. Barrett é professor de Administração e Políticas Públicas Globais, doutor em Comportamento Organizacional , músico e pianista de Jazz.


segunda-feira, 25 de agosto de 2025

O Efeito Dunning-Kruger no ambiente de trabalho

"O problema da humanidade é que os estúpidos estão cheios de certezas, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas" (Bertrand Russel)


Sabe aquele supervisor, gerente ou mesmo colega de trabalho que adora convencer os seus parceiros só no grito? Sempre aos berros, acredita que seja o dono da verdade em tudo, ninguém sabe mais do que ele e não admite o contraditório nem qualquer crítica ou questionamento? Isso tem um nome: Efeito Dunning-Kruger.  No entanto, o inverso também ocorre e portanto temos duas situações:

- pessoas com baixa competência tendem a superestimar as suas habilidades.

- pessoas competentes tendem a subestimar as suas habilidades.

Muitos ambientes de trabalho estão cheios desse tipo de pessoa. O vídeo abaixo muito divertido explica detalhadamente como essa síndrome foi descoberta por dois psicólogos sociais, David Dunning e Justin Kruger após analisar um assalto a banco mal sucedido.

O único caminho para evitar o efeito Dunning-Kruger é investir no conhecimento permanente e ter a humildade em reconhecer que não se pode saber tudo nesse mundo. Com a palavra o filósofo Sócrates: 

"Eu só sei que nada sei".









Carta de Referência não serve para nada, papel aceita qualquer coisa

Novamente trago em pauta um tema que já escrevi a respeito recentemente nesse artigo . É inacreditável como muitas empresas (leia-se gestore...