Por aqui, imposto é caridade
Por Ubiratan Iorio e Leandro Roque*, publicado no Instituto Misses Brasil
Imagine que você queira abrir uma loja para vender sapatos. Para isso, terá de obter autorização do governo. Como a burocracia no Brasil é enorme, você só conseguirá essa autorização dentro de aproximadamente cinco meses.
Para efeitos de comparação, se você vivesse na Nova Zelândia, em menos de um dia (!) já poderia abrir a sapataria.
Ou seja: enquanto na Nova Zelândia você tem a ideia de abrir a empresa hoje e já pode começar a operar amanhã, no Brasil, você deixaria de vender sapatos e, portanto, de ganhar a receita das vendas por quase cinco meses. Nesse período, estaria apenas lidando com papeis, taxas, cobranças, cartórios, filas, carimbos e licenças (e provavelmente teria de "molhar" a mão de vários fiscais para conseguir alguma "agilidade").
Mais: supondo que você desejasse contratar dois vendedores para trabalharem na loja, durante esses cinco meses essas duas pessoas não teriam os seus empregos. Na Nova Zelândia, ambos já estariam empregados amanhã.
Assim, a primeira conclusão é que, no Brasil, as instituições (no exemplo dado, a burocracia e a intromissão do governo na vida das pessoas) desencorajam qualquer pessoa que queira trabalhar e produzir para melhorar de vida. Em outros países, como a Nova Zelândia, as instituições estimulam as pessoas que desejam progredir.
Continuando.
Após abrir a sua sapataria, você terá de trabalhar até o dia 2 de junho de cada ano apenas para pagar os 93 tributos (impostos, taxas e contribuições) que existem no Brasil. E pagar esses impostos requer 2.600 horas apenas para preencher os formulários (mais do que o dobro do segundo colocado, a Bolívia). Quem não pagar é punido com cadeia e confisco de bens.
O estado argumenta que a receita dos tributos é para ser revertida em educação, saúde, justiça, segurança e infraestrutura.
A inevitável pergunta é: apesar de, como brasileiro, sermos obrigados a trabalhar mais de cinco meses do ano para o governo, temos um sistema de educação bom? De saúde? Nossa justiça é boa? Vivemos com segurança? Nossas estradas e portos são bons? Ainda mais importante: por que esses cinco itens devem ficar nas mãos do governo? Na prática, estamos trabalhando cinco meses de graça.
Paulo Francis já dizia: no Brasil, imposto é caridade. Você dá seu dinheiro para o governo já sabendo que não receberá nada em troca.
E agora piora para todos.
Se você contratar um empregado com um salário de mil reais por mês, esse empregado pode chegar a lhe custar, aproximadamente, dois mil e oitocentos e trinta reais por mês — ou seja, mais do que o dobro do salário. (O corriqueiro é que ele custe, no mínimo, dois mil reais).
Isso acontece porque existem os chamados encargos sociais e trabalhistas, como INSS, FGTS, PIS/PASEP, salário-educação, Sistema S, 13º salário, adicional de remuneração, adicional de férias, ausência remunerada, férias, licenças, repouso remunerado, rescisão contratual, vale-transporte, indenização por tempo de serviço e outros benefícios.
Tais encargos fazem com que, além do salário, o empregador tenha de pagar o equivalente a outro salário só com estes custos.
Considerando o salário mínimo de 2017, de R$ 937, o empregador terá de pagar R$ 2.651 por empregado. Isso significa que, para compensar sua contratação, o trabalhador precisa de uma produtividade de, no mínimo, R$ 2.651 para poder trabalhar legalmente.
O resultado disso é que, na melhor das hipóteses, em vez de empregar aqueles dois funcionários, você vai empregar apenas um na sua sapataria. Se muito.
A diferença entre o custo total do trabalhador e o valor total recebido por esse trabalhador é chamada de "custo da legislação trabalhista".
Não é necessário ser profundamente douto em economia para perceber que esses encargos provocam um "desemprego artificial", impossibilitando a contratação de pessoas que realmente estão dispostas a trabalhar, mas que não conseguem emprego porque o governo elevou artificialmente o preço de sua mão-de-obra.
Sendo o trabalho formal no Brasil muito caro em relação à produtividade, a inevitável consequência é que, das 90 milhões de pessoas que integram a população economicamente ativa no Brasil, apenas 34 milhões têm carteira assinada.
Por outro lado, 10 milhões de trabalhadores estão no mercado informal (dados mais abrangentes falam de 44 milhões).
Para completar seu pesadelo empreendedorial, ainda falta mencionar os outros impostos que incidem sobre as empresas e que afetam sobremaneira sua capacidade de investir, de contratar e de aumentar salários. No Brasil, a alíquota máxima do IRPJ é de 15%, mas há uma sobretaxa de 10% sobre o lucro que ultrapassa determinado valor. Adicionalmente, há também a CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido), cuja alíquota pode chegar a 32%, o PIS, cuja alíquota chega a 1,65% e a COFINS, cuja alíquota chega a 7,6%. PIS e COFINS incidem sobre a receita bruta.
Há também o ICMS, que varia de estado para estado, mas cuja média nacional beira os 20%, e o ISS municipal. Não tente fazer a conta, pois você irá se apavorar.
E tudo isso sem considerar todas as incertezas jurídicas e empreendedoriais (impossíveis de ser calculadas) causadas pela Justiça do Trabalho, instituição esta que faz com que contratar um empregado seja um ato de altíssimo risco financeiro, o qual pode inclusive destruir todo o seu capital acumulado.
No final, o custo de todo esse sistema tanto para o empreendedor quanto para o trabalhador é muito maior do que as eventuais vantagens que o governo afirma que ele oferece (se é que há alguma).
Não tem como dar certo
O resultado dessa equação é trágico: empaca-se o avanço da criação de riqueza e dos negócios, a oferta de empregos diminui e a economia fica estagnada. Com o empreendedorismo legal e mercado de trabalho artificialmente encarecidos pelo governo, um número cada vez maior de pessoas (as mais preparadas) passa a almejar um posto nas instituições públicas, dedicando a fase produtiva de sua vida a estudar para concursos.
Assim, cria-se um círculo vicioso: o governo asfixia o empreendedorismo com impostos, burocracias e regulamentações. Isso mantém os salários baixos e o desemprego algo. Os menos preparados são empurrados para a informalidade. Os salários baixos da economia formal empurram jovens capacitados para o setor público, que garante estabilidade e altos salários.
Mas todos os privilégios do setor público são bancados por impostos e endividamento do governo, os quais são integralmente pagos por essa mesma iniciativa privada já asfixiada. Isso deprime ainda mais os salários do setor privado, o que empurra ainda mais jovens preparados para o setor público.
Conclusão
Nossa pobreza, ou "falta de riqueza", não é uma questão de falta de vontade política ou de votarmos em pessoas erradas, mas uma mera consequência do nosso arranjo institucional e tributário: presos em um emaranhado de altos tributos, burocracias e regulações, pequenos empreendedores não encontram nem tempo nem espaço para produzir, trabalhadores não podem receber salários estimulantes, e o governo suga a pouca riqueza disponível para sustentar a máquina pública e o salário de seus funcionários, os quais são retirados da iniciativa privada.
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*Ubiratan Jorge Iorio é economista, Diretor Acadêmico do IMB e Professor Associado de Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Leandro Roque é economista e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.
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