segunda-feira, 27 de julho de 2020

Aplicação de quebra-cabeças, teste de QI e perguntas impossíveis nas entrevistas de emprego: isso tudo é necessário?

Há alguns anos atrás tomei conhecimento do interessante livro “Como Mover o Monte Fuji?”, do premiado escritor e pesquisador William Poundstone. Ele se dedicou com afinco à pesquisa dos testes de recrutamento e seleção aplicados pela Microsoft, testes esses depois copiados pelas mais importantes companhias de TI e depois pelas mais badaladas consultorias financeiras de Wall Street que constantemente figuram na revista Fortune.

Perguntas como a do titulo livro, entre outras, tais como, “como você testaria um saleiro?”, “quantas vezes por dia os ponteiros dos relógios se sobrepõem?”, “o sol nasce no leste?”, “se você pudesse eliminar um dos estados americanos, qual deles seria?”, além de testes de QI e quebra-cabeças lógicos inimagináveis (alguns bolados pelo próprio Bill Gates, um fissurado em quebra-cabeças) com um prazo bem curto para ser respondido, todo esse pacote que passa por três ou às vezes até quatro entrevistadores faz parte do processo de recrutamento e seleção da Microsoft.

Uma das razões disso tudo é observar como o candidato atua em situação de estresse, a sua habilidade de raciocinar abstratamente e manipular conceitos; como usa a sua imaginação na resolução de problemas. E aqui não importa o que o candidato fez de bom no passado em outras empresas, mas o que ele poderá fazer beneficamente no futuro dentro da companhia.

Joel Spolksky, um dos recrutadores da Microsoft afirmou que os maiores desafios no recrutamento são: “identificar pessoas inteligentes que não sabem realizar e pessoas que sabem realizar, mas não são inteligentes”. Esses dois tipos devem ser evitados, pois o que a empresa quer obviamente são pessoas inteligentes e que sabem realizar. Vejam a justificativa do recrutador Spolsky:

“As pessoas inteligentes que não sabem realizar, costumam ter PhD  e trabalham em grandes empresas, mas ninguém lhes dá ouvidos porque não são nada práticas; já as pessoas que sabem realizar, mas não são inteligentes, fazem coisas estúpidas sem pensar, depois alguém tem que limpar a sujeira”. Não só a Microsoft, mas todas as empresas de TI, por motivos óbvios não podem errar na contratação de seus funcionários de nível técnico (desenvolvedores de software) para cima.

No entanto, esses métodos de recrutamento são questionados e com muita propriedade por Poundstone em seu livro. Vamos pontuar alguns deles:

-A comunidade científica refuta com veemência a teoria do QI (elaborada pelo francês Alfred Binet e aperfeiçoada pelo psicólogo americano Lewis Terman), pela sua falta de precisão, pois não existe medida científica para a inteligência.

-A Neurociência já catalogou sete tipos de inteligência do hemisfério cerebral, sendo elas: Linguística, Lógico-Matemática, Musical, Espacial, Motora, Interpessoal e Intrapessoal. Cada pessoa, conforme sua experiência de vida aplica cada uma delas de maneiras diferentes.

-Pessoas que são muito boas em algumas coisas nem sempre são boas em outra, pois o raciocínio que funciona em um problema pode não funcionar em outras situações.

Pois muito bem, ocorre que simulações de situações de estresse são situações criadas artificialmente naquele momento dos testes e isso é bem diferente de uma situação real que ocorre durante o trabalho. Não há garantia alguma que se o candidato se sair bem numa situação criada artificialmente também o fará numa situação real ou vice-versa. Fatores externos não identificáveis podem contribuir para o acerto ou para o erro. Por exemplo, pilotos de aviação com vasta experiência podem cometer equívocos irreversíveis ou serem consagrados como heróis, tudo vai depender das condições identificáveis ou não.

É fato que muitas empresas deixaram de contratar excelentes profissionais que se saíram mal nos testes das entrevistas. É fato que aquele candidato que passou em todos os testes e que foi contratado acabou se revelando um fiasco profissional tendo que ser demitido em poucos meses. E aqueles que foram reprovados nos testes e não foram contratados fizeram carreiras brilhantes em outras companhias.

Portanto, as entrevistas com perguntas básicas e tradicionais e na sequência perguntas pertinentes à experiência profissional ainda é o melhor método na seleção de pessoas. Simular uma situação artificial de tensão no candidato, sobretudo para aferir a sua inteligência não é recomendável por falta de conexão com uma situação real. Para concluir com uma frase do próprio Poundstone, “medir inteligência é como tentar fixar gelatina na parede”.

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