terça-feira, 13 de junho de 2017

O uso de uniforme preto para o trabalho é inadequado e reduz a produtividade

O uso de acessórios pretos é chique, elegante e tem conotação de nobreza. Carros, smartphones, computadores, utensílios domésticos, todos na cor preta entram no rol da preferência nacional. Afinal, quem não dispõe em seu closet de um pretinho básico para ocasiões especiais? Seja um terno, um blazer, um tailleur? Porém, quando a pauta é o uso de uniforme preto no trabalho, muda-se radicalmente o tom da questão.

Não pretendo com esse artigo entrar profundamente na questão da Teoria das Cores. Entretanto, foi necessário o seu estudo para podermos compreender como as cores interagem na nossa percepção de forma positiva ou negativa, prazerosa ou incômoda. Obviamente que o ambiente de trabalho não foge a esse critério e o grande vilão dessa história é a escolha do uniforme preto, fato que muitas empresas adotam para uso de seus funcionários.

Analisaremos neste artigo, o impacto e as reações físicas e psicológicas que um uniforme preto causa no corpo humano.

Uma rápida introdução sobre a teoria das cores:

A cor é assimilada através da visão e conduzida até o córtex cerebral. Este, processa o seu impacto no organismo produzindo reações corporais, bem como sensações boas ou ruins. Preto vem do latim “pressus”, que significa, apertado, denso, comprimido, espremido, etc. Há diversos tons de preto, podemos obtê-los através da mistura de tintas com as seguintes combinações de cores e suas gradações variadas, sendo que, cada combinação delas resultará em tons diferentes de preto:

Amarelo + Rosa + Azul = Preto
Verde + Vermelho = Preto
Azul + Laranja = Preto
Azul + Marrom + Preto 

Como o organismo reage ao preto? Chegamos agora no âmago da questão: o uso de roupa preta, no caso específico, de uniforme de trabalho, gera uma absurda e altíssima sensação térmica no corpo humano, causando enorme desconforto e mau humor, excesso de sudorese, cansaço e indisposição para o trabalho, sobretudo em dias de alta temperatura. A cor preta irá absorver toda luz e claridade solar retendo no organismo alta temperatura decorrente do grau de calor obtido. Além disso, a retina também é afetada e o resultado é uma desconfortável tensão ocular.

É sem dúvida alguma a pior cor escolhida para ser usada para uniforme de trabalho, embora seja nobre e elegante. Levando-se em conta o clima tropical do país de altas temperaturas praticamente o ano todo, o seu uso é absolutamente inadequado.

Saí a campo para abordar trabalhadores (ambos os sexos) que estavam usando uniforme preto. Também abordei os que usavam uniforme em outras cores, tais como, bege, azul, verde e rosa. A pergunta que fiz a cada um foi: você se sente bem com esse uniforme? Não mencionei a cor nem o modelo. O interessante é que a maioria dos que usavam uniforme em outras cores que não o preto, se sentia bem e os poucos que reclamaram não se referiram à cor, mas ao modelo do uniforme. Já os que usavam uniforme preto, a maioria teve queixas, sendo que alguns não souberam dizer os motivos do desconforto e não relacionaram à cor. Porém, a maioria dos queixosos reclamou do calor e da sensação térmica desconfortável.

Essa pesquisa foi feita em lojas abertas, papelarias, perfumarias, confeitarias, lojas de armarinho, comércio em geral que não dispunham de aparelho de ar condicionado. Naturalmente que aquele funcionário que trabalha em empresa equipada com ar condicionado não sente tanto o impacto do calor. No entanto, se ele já tem que sair de casa uniformizado e utilizar metrô, ônibus, enfrentar o trânsito caótico e modorrento, ele sentirá bastante desconforto, sobretudo pelo excesso de sudorese e a consequente perda de sais minerais. Naturalmente que ao chegar à empresa o seu ritmo de trabalho e produtividade estarão abaixo do normal.

Enquanto o tecido preto absorve exponencialmente os raios solares retendo no corpo uma alta temperatura, os tecidos claros ao contrário, refletem a luz produzindo no organismo a sensação de frescor e conforto. Não à toa, os árabes usam túnicas claras, brancas ou bege que refletem todo o calor e a energia da luz solar.

Os beduínos usam túnicas pretas durante o dia. Mas esse fato ocorre em razão justamente da oscilação brutal de temperatura no deserto, que durante o dia, atinge 50ºC e à noite cai vertiginosamente para – 10ºC negativos. A retenção do calor obtido pelo uso da túnica negra durante o dia garante o aquecimento térmico corporal  durante a noite, pois o frio seria insuportável.

Especialistas em cores, em óptica e psicologia, tais como, Max Lüscher, Herman Rorschach (vide Gestalt, a Psicologia da Forma e o teste das manchas Rorschach), entre outros, realizaram estudos sobre o impacto psicológico das cores no organismo. Desses estudos, a cor preta sempre esteve mencionada de maneira negativa. Ela se relaciona com sombra, noite, fim, melancolia, miséria, angústia. É a cor mais pesada numa escala de aferição de volume (psicológico) comprovada por testes comparativos (objetos com o mesmo peso pintados em cores diferentes, o preto se revelou a cor mais pesada) a outras cores.

O famoso pintor cubista Fernand Léger, ícone da pintura moderna, desenvolveu estudos sobre a reação corporal à cor. Além dele, Leonardo da Vinci, Wolfgang Goethe, Arthur Schopenhauer entre tantos outros também se debruçaram exaustivamente sobre o tema.

Um teste bem simples e fácil que qualquer pessoa poderá fazer é o seguinte: Obter duas camisetas idênticas, do mesmo tecido podendo ser de algodão, sendo uma totalmente branca (ou de outra cor em tons claros) e outra preta. Lavá-las e pendurá-las no varal. Em menos de duas horas a camiseta preta estará completamente seca, enquanto a branca levará praticamente o dia todo para secar. A camiseta preta absorveu rápida e quase que instantaneamente o calor do sol, enquanto a branca o refletiu.

De nada adianta profissionais da indústria têxtil e estilistas dizerem que isso é mito porque não é.  Ainda que tecidos especiais sejam desenvolvidos na cor preta para garantiram conforto maior sem gerar aquecimento, de nada vai adiantar. A questão não é e nunca será o tecido, mas a cor preta, mesmo que o pigmento de tingimento seja de boa qualidade. Por mais nobre que seja esse tecido, sendo na cor preta, ele vai absorver calor demasiado e atingir alta temperatura em relação a outro tecido de cor clara.

E qual seria então a cor adequada para uniformes de trabalho? A ABNT sempre tem se debruçado sobre a questão. Por enquanto, as normas técnicas se reportam mais ao que diz respeito ao vestuário de segurança no trabalho, sobretudo em zonas de perigo e alerta. Não há ainda uma norma técnica específica que defina a cor adequada para uniformes comuns, seja no setor administrativo das empresas ou no comércio em geral.

É de bom senso que se evite cores em tons escuros pelas razões expostas no artigo em tela, tais como, marrom, cinza chumbo e azul marinho. São cores que absorvem altas temperaturas. Deve-se dar preferência para as cores claras. Os especialistas que pesquisaram o tema sugerem uniformes nas cores verde e bege (e seus nuances e gamas em gradações variadas) como as mais adequadas. 

Nunca se falou tanto em qualidade de vida no trabalho. Grande parte das empresas está se empenhando para que seus colaboradores executem suas funções da maneira mais agradável e confortável possível, sobretudo no aspecto ergonômico. Louvável atitude que evita a médio e longo prazo doenças ocupacionais, problemas com a fiscalização do trabalho e com a previdência social.

Isto posto, é recomendável que a utilização do uniforme preto seja repensada e a escolha de sua cor seja melhor planejada visando o bem estar do funcionário. A partir do ponto em que alguém determina uma cor de uniforme para seus colaboradores, seja o proprietário da empresa, o chefe do RH ou o técnico em segurança do trabalho, assume-se o ônus e o bônus, devendo o responsável responder pelas consequências de tal escolha, seja ela boa ou ruim.

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Bibliografia:

ALBERS, Josef. A Interação da Cor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009

ARNHEIM, Rudolf. Arte e Percepção Visual. São Paulo: Thomson Pioneira, 1998

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15292. Artigos confeccionados-vestimenta de segurança de Alta visibilidade. Rio de Janeiro, 2013

FARINA, Modesto. Psicodinâmica das Cores em Comunicação. São Paulo: Blücher, 2000

GUARNELLI, Ismael. Cores Cor Uso e Abuso. Desktop Publishing Revista de Editoração Eletrônica e Computação Gráfica. São Paulo: Expressão Editorial

GOETHE, Johann Wolfgang von. Doutrina das Cores. São Paulo: Nova Alexandria, 1993

LÉGER, Fernand. Funções da Pintura. Rio de Janeiro: Nobel, 1989 

LÜSCHER, Max. O Teste das Cores. Rio de Janeiro: Renes, 1989

PASTOREAU, Michel. Preto - História de Uma Cor. São Paulo: Senac, 2011

PEDROSA, Israel. Da Cor à Cor Inexistente. São Paulo: Senac, 2009

RORSCHACH, Hermann. Psicodiagnóstico. São Paulo: Mestre Jou, 1967

SCHOPENHAUER, Arthur. Sobre a Visão e as Cores. São Paulo: Nova Alexandria, 2003

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