segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Mentir no currículo não caracteriza justa causa e também não é crime!



Todo cuidado é pouco ao assistir os zilhões de vídeos no Youtube que tratam sobre temas trabalhistas. Até reconheço que muitos que se propõem a tratar desse labiríntico e espinhoso tema possuem as melhores das intenções (ou não quando só desejam os "likes") para com os seus inscritos ou não inscritos em seus respectivos canais. No entanto, vejo muita irresponsabilidade, falta de estudo e pesquisa quando passam orientações absolutamente equivocadas ou mesmo desatualizadas da legislação. Num desses vídeos, um senhor que se apresenta como advogado disparou groselha dizendo que mentir no currículo dá justa causa, além de ser crime! Mon Dieu!! Até um estagiário de RH daria boas risadas dessa groselhada. Vamos por partes.

O advogado citou o artigo 482 da CLT que trata da justa causa e que fala sobre a quebra de confiabilidade entre empregado empregador. Confiabilidade? Oi? Como assim? Então vamos lá: 

- Não existe nenhuma alínea no artigo 482 da CLT que trate do termo "confiabilidade". Os atos falhos cabíveis de Justa Causa ocorrem somente enquanto o funcionário seja empregado registrado, no exercício de suas funções não sendo possível puni-lo com a Justa Causa por uma mentira contada no currículo antes de se tornar empregado. Um tanto quanto óbvio essa questão, não? Como imputar culpa dolosa numa pessoa que ainda nem contratada ela foi?

- O advogado, absolutamente sem prática do assunto, desconhece que um candidato se submete a pelo menos três ou até mais entrevistas antes de ser aprovado na seleção. Cabe aos entrevistadores detectar possíveis mentiras, pois são treinados para isso e no caso de falhas, eles responderão pelas consequências pela inépcia na seleção e escolha. Se o entrevistador não detectar possíveis mentiras, ele terá que se entender posteriormente com o seu gestor.

- O funcionário mentiroso PODE SIM SER DEMITIDO, porém não por Justa Causa, jamais, mas por demissão normal. Aliás, é para isso que existe o período de experiência ou probatório. Vamos supor que o candidato minta afirmando em seu currículo que domina o aplicativo Excel no módulo avançado e quando é solicitado para criar alguma planilha financeira complexa ele não consiga. Os recrutadores também podem sofrer punição pela falha no recrutamento, mas neste caso específico não cabe Justa Causa.

Mentir no currículo NÃO É CRIME!

Muitos desses youtubers palpiteiros citam os artigos 297, 298 e 299 do Código Penal, artigos esses que tratam da falsidade ideológica, alteração e falsificação de documentos públicos ou particulares. Ocorre que a 6ª turma do STJ, decidiu que “Não configura falsidade ideológica a conduta do agente de inserir, em currículo Lattes, dado que não condiz com a realidade”. (STJ. 6ª Turma. RHC 81.451-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/8/2017). O STJ ainda foi além e disse o seguinte: “ainda que o currículo Lattes pudesse ser considerado um documento digital válido para fins penais, mesmo assim não teria havido crime. Isso porque, como qualquer currículo, seja clássico (papel escrito) ou digital, o currículo Lattes é passível de averiguação, ou seja, as informações nele contidas deverão ser objeto de aferição por quem nelas tenha interesse”

Quando o documento é passível de averiguação, o STJ entende que não há crime de falsidade ideológica, mesmo que o agente tenha inserido nele informações falsas. Já se sedimentou na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que a petição apresentada em Juízo não caracteriza documento para fins penais, uma vez que não é capaz de produzir prova por si mesma, dependendo de outras verificações para que sua fidelidade seja atestada. (...)  (STJ. 5ª Turma. RHC 70.596/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 01/09/2016). Pronto! De novo: NÃO É CRIME MENTIR NO CURRÍCULO!

Por fim, mentir no currículo sem dúvida alguma é uma péssima ideia e que já coloca sob suspeita a conduta ética desse profissional qualquer que seja a sua área de atuação. As informações contidas são de total responsabilidade do candidato e ato contínuo, ele vai responder por elas inexoravelmente de uma forma ou de outra. Não adianta mentir que fala inglês fluentemente, ele será pego na entrevista e antes que ele diga oh yeah, ele ganhará um sutil bye bye so long, ou melhor, bye bye and see you never again. Walk on bye!


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