segunda-feira, 8 de julho de 2019

Bacenjud bloqueia conta-salário! Isso é permitido?


Desde dezembro de 2018, o sistema BACENJUD (penhora online) está bloqueando indevidamente contas-salários de trabalhadores. Tive conhecimento de alguns casos dessa natureza e que estão causando um verdadeiro calvário na vida dos trabalhadores para terem as suas contas-salários desbloqueadas. Obviamente que essa ação do BACENJUD é de uma aberração jurídica sem precedentes e como eu sempre digo aqui, é mais uma tijolada do estado na cabeça dos trabalhadores, isto porque, de acordo com o artigo 833 do Novo Código de Processo Civil, os salários são impenhoráveis.

Para quem ainda não sabe, o que é o BACENJUD?

O Bacen Jud é um instrumento de comunicação eletrônica entre o Poder Judiciário e instituições financeiras e demais autorizadas a funcionar pelo BC, com intermediação, gestão técnica e serviço de suporte a cargo do Banco Central (BC).  Por meio desse sistema, os magistrados protocolizam ordens judiciais de requisição de informações, bloqueio, desbloqueio e transferência de valores bloqueados, que são transmitidas às instituições para cumprimento e resposta. [1]

Pois bem, quem tem processo por dívidas já em fase final de execução no qual o juiz já determinou a penhora de bens, a primeira opção para a quitação da dívida é em espécie, ou seja, a quantia em dinheiro que o executado mantém em sua conta bancária. Ocorre que essa penhora começou a atingir as contas-salários de trabalhadores, o que é expressamente proibido por lei.

Isso está ocorrendo com maior frequência coincidentemente após uma alteração no regulamento do BACENJUD em Dezembro de 2018. Além disso, o monitoramento é feito pelo rastreio do número de CPF do executado, razão pela qual, o sistema não tem como detectar a origem dos valores disponíveis em conta. Vejamos então a nova redação do parágrafo 4º do artigo 13 do regulamento do BACENJUD:

“§ 4º: Cumprida a ordem judicial na forma do § 2º e não atingida a integralidade da penhora nela pretendida, sendo assim necessária a complementação (cumprimento parcial), a instituição financeira participante deverá manter a pesquisa de ativos do devedor durante todo o dia, até o horário limite para a emissão de uma Transferência Eletrônica Disponível (TED) do dia útil seguinte à ordem judicial ou até a satisfação integral do bloqueio, o que ocorrer primeiro. Neste período, permanecerão vedadas operações de débito (bloqueio intraday), porém permitidas amortizações de saldo devedor de quaisquer limites de crédito (cheque especial, crédito rotativo, conta garantida etc.)”.

Grosso modo, para simplificar, a conta bancária do executado fica monitorada permanentemente pelo sistema BACENJUD, até que o valor total da dívida seja quitado. Exemplo: se a dívida é de 5 mil reais e conta bancária dispor de um saldo de 500 reais, esse valor já estará bloqueado para o pagamento da dívida e todo valor que ser depositado nessa conta estará indisponível para o correntista, salvo amortizações de cheque especial. Não adianta falar com o gerente do banco, ele apenas está cumprindo uma ordem judicial e não tem poderes para o desbloqueio da conta, ainda que seja conta-salário.

Agora vejamos o que o Novo Código de Processo Civil diz sobre a impossibilidade de penhora de alguns bens:

Artigo 833: São impenhoráveis:

IV- os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios o on montepios, bem como, as quantias recebidas por liberalidade de terceiros e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o artigo 2º.

x- a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos.

§ 2o: O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8o, e no art. 529.

É importante constar aqui, que uma outra possibilidade de bloqueio de valores de natureza salarial é para o pagamento de dívidas trabalhistas, por exemplo: tenho conhecimento de diversos casos de empregadoras domésticas que tiveram suas contas-salários bloqueadas (inclusive de aposentadorias) para saldar ações trabalhistas ajuizadas por suas empregadas, conforme decisão determinada em juízo.

E qual é a solução para o correntista que tiver a sua conta-salário bloqueada? A única solução possível é constituir um advogado ou defensor público, se for o caso, para entrar imediatamente com uma ação para apreciação do magistrado. Normalmente, nesses casos, em razão da urgência e gravidade da situação, o advogado costuma pedir tutela antecipada concomitantemente com reparação de danos morais e materiais. Mas mesmo sendo urgente, isso pode demorar um pouco e complicar a vida do trabalhador que depende de seu salário para o seu sustento e de sua família.

É sempre oportuno reiterar que salários, honorários, aposentadorias e pensões são pagamentos que estão automaticamente protegidos da penhora, salvo a pensão alimentícia e importância que excedem a 50 salários mínimos, conforme determina o artigo 833 do Novo Código do Processo Civil.

Isto posto, é de extrema urgência que o Banco Central corrija o quanto antes o regulamento do sistema BACENJUD, sobretudo essa alteração bizarra do mal elaborado artigo 4º citado acima, que acabou colocando no alvo de ataque, as contas-salários de todos os trabalhadores. Quem elaborou o regulamento, deveria antes se inteirar do artigo 833 do Novo Código de Processo Civil que proíbe expressamente a penhora de salários. Ou o Novo Código de Processo Civil não vale nada?
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[1] Banco Central

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