segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Artigo 483 da CLT (Rescisão Indireta) é letra morta

O artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT é conhecido por permitir que o empregado demande a justa causa contra o empregador. Também chamado pela equivocada denominação de “rescisão indireta” (para mim, toda rescisão é direta, de uma maneira ou de outra), com suas sete alíneas, raramente é figura presente nas demandas trabalhistas e quando ocorre, é muito rara a decisão em juízo aceitar a denúncia de justa causa. Vejamos:

Em primeiro lugar, devemos levar em conta que a grande maioria de trabalhadores, inclusive do setor administrativo, desconhece a opção da rescisão indireta e quem a conhece, de início, como sempre cito em meus artigos neste blog, se sente constrangido em demandar o empregador, estando ainda prestando serviços na empresa. Em segundo lugar, mesmo que o empregado utilize esse remédio, as suas chances de vitória são quase nulas podendo o remédio funcionar como veneno contra si próprio como veremos mais adiante.

Conforme o saudoso e ilustre jurista e que atuou muito tempo como magistrado, Dr. Wagner Giglio, fartamente pesquisou e escreveu a respeito do tema em tela, a demanda da rescisão indireta, sempre peca pela má formulação do pedido elaborado pelo advogado do reclamante e pelo vício da desatualização, ou seja, pela falta da imediatidade dos fatos ocorridos.

Tomando como exemplo, o artigo 483, alínea “a”, a saber, de “serviços exigidos pelo empregador alheios ao contrato de trabalho” e a análise cirúrgica do ilustre jurista e professor Giglio:

“Convém ressaltar, contudo, que se os serviços alheios forem cumpridos pelo empregado, durante tempo apreciável, sem irresignação, entende-se que passam a integrar suas funções, por renúncia tácita de denunciar a alteração. Assim, a alegação tardia de inconformismo seria repelida por desatualização da falta ou, ainda porque não se estabeleceria o vínculo da causa e efeito entre a infração e a rescisão”.

Ainda na alínea “a”, do artigo 483, sobre os "serviços exigidos superiores às suas forças”, assinala o ilustre jurista:

"Na vida prática, raras são as ocorrências que se enquadram com precisão na hipótese legal de exigência, do empregado, de serviços superiores às suas forças, certamente porque seria necessária um grande dose de insensibilidade ou de maldade, do empregador ou do superior hierárquico, para caracterizar a ordem ilegal.”

“A alegação dessa justa causa encobre, algumas vezes, a malícia de empregado desidioso, que se recusa a executar serviços que, embora pesados, não excedem sua capacidade normal de trabalho.”

Sobre o rigor excessivo disposto na alínea “b”, do artigo 483, já tratei dessa questão neste artigo. Lembrando que, para que seja caracterizado o rigor excessivo, ele deve se repetir com insistência e ter características persecutórias.

A alínea “d”, do artigo 483, que dispõe sobre o "não cumprimento das obrigações contratuais", é o que mais motiva o empregado (desde que ele tenha conhecimento do artigo 483) a demandar a rescisão indireta. A falta de recolhimento do FGTS em dia, o não recolhimento do INSS, o atraso sistemático do pagamento dos salários, o não pagamento das férias, são consideradas infrações gravíssimas e justificam plenamente a denúncia do contrato pelo empregado, diante da frustração de seus direitos.

Ocorre que, no caso da alínea “d’, quando o empregador toma ciência da notificação trabalhista, ele rapidamente providencia o recolhimento dos encargos em atraso com juros e correção monetária muito antes do dia da audiência.

Os juízes do trabalho tendem a seguir os mais influentes doutrinadores do direito do trabalho universal, e neste caso, citemos o doutrinador Guido Bortolotto, sobre a justa causa, de ambos os lados. Três perguntas devem ser feitas:

"1)  houve a falta?

2)  há nexo de causalidade entre a falta e seu suposto autor?

3) essa falta é de tal modo grave que impede a continuação, ainda que provisória, do vínculo de emprego?"

“Só haverá ato faltoso bastante para justificar a rescisão, quando se verificar uma violação, de tal modo grave, que impeça a continuação mesmo provisória, da relação de trabalho”.

Ressalte-se que, a manifestação da vontade de resilição contratual, uma vez transmitida, torna-se irrevogável unilateralmente, salvo se a retratação chegar ao conhecimento do receptor em tempo hábil. A revogação tardia não produz efeito, salvo com a concordância do receptor.

Como constatamos, o artigo 483 da CLT é mais uma jabuticaba jurídica, foi muito mal elaborado (como o restante da CLT) somente para inglês ver. Ou seria para italiano ver?

Para concluir, se a justa causa ser indeferida em juízo o que acontece? Simples, nesse caso a rescisão é transformada em rescisão normal, por iniciativa do empregado e assim sendo, será descontado o aviso prévio, não há saque do FGTS, nem o pagamento da multa e sem direito ao Seguro Desemprego. Ou seja, é a típica situação em que o remédio se transformou em veneno contra o próprio paciente.

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