quinta-feira, 3 de agosto de 2017

O lado bom de ser demitido




Por Jeffrey Tucker,* publicado no Instituto Misses Brasil


Esta pode ser a melhor maneira de você progredir na carreira e na vida

Você trabalha em uma empresa e repentinamente é demitido. De primeira, você fica aborrecido. Em vários casos, fica até mesmo revoltado. Mas como você deveria agir?

O ideal seria que você apenas seguisse em frente, com a cabeça erguida, procurando um novo emprego e uma forma de continuar subindo na vida. Você olharia para trás e diria: "Quer saber? Essa demissão foi, na realidade, uma coisa boa".

Possível? Totalmente.

A verdade é que ser demitido é uma das melhores coisas que pode acontecer a você, desde que você saiba enxergar tudo da maneira certa. Não há por que considerar o evento como o fim do mundo. Pode ser o início de coisas verdadeiramente positivas. Sim, tudo isso soa como um surrado clichê, mas realmente é verdade. Ser demitido é algo que não apenas irá inspirar você a alcançar novos graus de excelência, como também pode lhe ensinar lições importantes sobre os malefícios de se tornar excessivamente apegado a uma empresa ou mesmo a um roteiro único e pré-definido para a sua carreira.

Eis uma rápida história envolvendo um indivíduo que eu demiti. Após avisá-lo de sua demissão, ele se revoltou e se comportou muito mal, como algumas pessoas tendem a fazer. Isso é compreensível. Só que ele tinha talento. Isso era perceptível. Ele simplesmente não havia conseguido se adaptar ao emprego, principalmente porque aquele era o primeiro emprego de verdade que ele havia conseguido.

Alguns meses depois, recebi um telefonema de uma pessoa interessada em contratá-lo. Fui franco e sincero: sim, eu o havia demitido, mas com motivos. "Entretanto", prossegui, "imagino que isso tenha servido como um grande sinal de alerta para ele. Ele tem talento, e, como consequência, você terá agora um empregado dedicado e disposto a realmente trabalhar, e bem mais motivado. Eu fiz a parte difícil. Você colherá os benefícios."

Em resposta aos meus comentários, essa empresa o contratou. E, como eu já imaginava, esse indivíduo se tornou extremamente bem sucedido neste novo emprego. Ter sido demitido foi ótimo par ele. Do meu ponto de vista, foi essencial. Hoje, ele pode olhar para trás e dizer: foi uma ótima experiência.

O trabalho assalariado é uma via de mão dupla

O segredo para se entender tudo isso é analisar a natureza de um contrato de trabalho. Trata-se de um acordo baseado na expectativa de uma cooperação mútua, a qual melhora a situação tanto do empregador quanto do empregado. Caso não houvesse escassez no mundo, o empregador iria preferir não contratar ninguém e fazer tudo sozinho. Isso não apenas lhe pouparia recursos, como também, em todo caso, a maioria dos empregadores imagina poder fazer um trabalho melhor do que qualquer pessoa que venham a contratar. Eles apenas contratam porque sabem que não podem fazer tudo sozinhos.

A própria existência de empresas que empregam mais pessoas do que o número de proprietários é um fenômeno oriundo da necessidade de se dividir o trabalho. A teoria da divisão do trabalho e das vantagens comparativas mostra que, mesmo que o patrão seja o melhor contador, faxineiro, comerciante, desenvolvedor de página de website e especialista em marketing em todo o mundo, ele estará em melhor situação caso se especialize em apenas uma área, e entregue as outras tarefas para outras pessoas, mesmo que estas pessoas não sejam tão boas quanto ele nestas tarefas.

Cada empregador, portanto, considera cada decisão de contratação uma combinação entre temor ("não quero desperdiçar dinheiro!") e alívio ("finalmente poderei me concentrar em algo aqui!").

O empregado não está fazendo nenhum favor ao seu patrão ao meramente trabalhar ali. Já o patrão não deve ser visto como um generoso distribuidor de fundos, muito menos alguém sob uma obrigação moral de fazer redistribuição de renda. O empregado está ali porque a natureza do mundo e a escassez de tempo e recursos o tornam necessário.

Para que todo este arranjo funcione bem e pacificamente, é necessário haver benefícios mútuos. Sempre.

A separação é fácil

Quando este benefício mútuo deixa de existir, passa a ser do interesse de ambos os lados desfazer a relação. O empregado, que deixou de ser útil para aquele patrão, estará livre para ir à procura de melhores e mais agradáveis oportunidades. Já o patrão poderá parar de pagar a esse empregado, que estava lhe oferecendo serviços que ele não mais acredita serem benéficos para a empresa.

Ser demitido significa apenas que o empregador tomou a iniciativa de parar de continuar financiando a relação. É claro que um dos lados ou ambos os lados podem estar errados, mas toda e qualquer decisão humana é especulativa; só agimos tendo por base as informações que temos (as quais são imperfeitas). Mas a verdadeira questão é: por que você continuaria em um jantar no qual você não é bem-vindo? Por que você continuaria em uma casa na qual não é querido? O mesmo é válido para um contrato de trabalho. Se você não é querido ali, você deve pedir para sair e, de imediato, se considerar em melhor situação por causa disso. Sem processos trabalhistas, sem reclamações, sem fofocas, sem rancor, sem amargura, sem atos de vingança. Apenas uma separação limpa e amigável.

A razão por que você foi demitido importa? Não muito. O próprio empregador nem sempre sabe o motivo. Ele apenas sabe que, do ponto de vista dele, a relação não mais está funcionando. E ele está em seu perfeito direito de terminá-la.

De novo: por que você iria querer continuar trabalhando para alguém que não mais lhe quer?

Por que eu fui demitido

Agora, deixe-me lhe contar sobre a vez em que eu fui demitido.

Eu trabalhava em uma loja que vendia ternos feitos sob medida. Fui considerado pela gerência o melhor vendedor da loja. Mas eu raramente me encontrava pessoalmente com meu empregador.

Durante uma temporada de natal, o patrão disse a todos os vendedores que, dali em diante, todos os pedidos de alteração nas medidas das roupas só poderiam ser prometidos para três semanas após a data da venda (quem fazia o trabalho de alfaiate era o próprio patrão).

Considerei aquele alongamento vergonhoso. Não era necessário tanto tempo.

Como era de se esperar, menos de uma hora depois, um cliente adentrou a loja e disse que compraria sete ternos caríssimos, mas com uma condição: todas as alterações teriam de estar prontas em, no máximo, uma semana.

Era de se esperar que eu fosse correndo até o padrão e o avisasse. Ele teria dito que não, tenho certeza.

Logo, eu não fiz isso. Apenas fui adiante e prometi ao cliente que as roupas estariam prontas em uma semana. Ao fim do expediente daquele dia, meu patrão descobriu os recibos, ficou enfurecido, jogou todos os sete ternos em cima de mim e exigiu saber "quem irá fazer as alterações neles?"

E então eu disse: "Eu irei". E imediatamente fui para a máquina de costura e comecei a trabalhar. Quando eram 9 da noite, eu já havia terminado todos os ternos. Imediatamente, levei todo o trabalho completo para o patrão e disse que eu mesmo entregaria os ternos pessoalmente ao cliente na manhã do dia seguinte.

Meu patrão, então, disse: "Ótimo." E completou: "Quando você terminar da fazer isso, não mais precisarei dos seus serviços."

Justo ou injusto?

Ele estava certo ou errado?

De um lado, ele estava errado ao imaginar que me demitir seria bom para seus negócios. Mas ele estava certo ao não aprovar o comportamento de um empregado desobediente.

Eis uma dica: se há uma atitude que irá seguramente fazer de você uma pessoa não mais desejada por um empregador, essa atitude é a insubordinação.

Mesmo de um ponto de vista puramente comercial, meu patrão precisava de uma equipe que seguisse suas ordens, fossem elas corretas ou erradas. Veja bem: esse não era meu estilo, mas era exatamente o estilo daquela loja. Por que eu me senti no direito de alterar todo o padrão de um empreendimento no qual eu não havia investido capital nenhum?

Após alguns dias, eu já havia conseguido um novo emprego. Acabei virando gerente em outra loja de roupas, diretamente concorrente à do meu antigo padrão. Dali em diante, minha loja superou a dele em todas as temporadas seguintes.

Ser demitido não significa que todo o seu tempo dedicado àquela empresa foi desperdiçado. Durante o período em que você trabalhou lá, tanto você quanto seu empregador se beneficiaram de alguma forma. Uma alteração nas condições não revoga essa realidade. O empregador ganhou um trabalhador. E você ganhou uma valiosa experiência — e uma das mais valiosas e necessárias experiências é o choque de ser demitido.

Em alguns casos, ser demitido é a melhor maneira de progredir. Todos nós precisamos de estímulos e de aprimoramentos. Vivenciar a experiência de uma rejeição direta é um pungente lembrete deste fato, e pode nos fornecer um grande ímpeto a uma mudança.

Além de frustrado, você pode se sentir enraivecido e até mesmo tomado pelo ódio. Você pode amaldiçoar seu patrão. É provável que queira processá-lo (esta sempre tende a ser a primeira reação de todo mundo).

No entanto, o que você realmente deve fazer é algo completamente contra-intuitivo. Respire fundo e diga aquilo que você realmente não está a fim de dizer. Você tem de agradecer ao seu patrão por ele ter tido confiança em você e por ter lhe dado a oportunidade de trabalhar lá. E você tem de dizer isso da forma mais sincera possível. E quando, no futuro, você por acaso se encontrar com seu ex-patrão em um supermercado ou em algum evento esportivo, você deve tratá-lo com enorme dignidade, como se ele fosse um velho amigo, e agradecê-lo novamente por tudo.

Se você fizer isso, pode acontecer de, no futuro — e, com efeito, isso quase sempre irá acontecer —, esta pessoa estar na posição de recomendar você para um emprego. A probabilidade de ele lhe recomendar e dizer coisas positivas a seu respeito será muito maior se você agir assim. Com efeito, ele poderá ficar tão positivamente impressionado com sua grandeza de espírito e magnanimidade, que poderá até lhe oferecer seu emprego de volta. E você pode, muito educadamente, recusar a oferta.

O ponto aqui é que não há absolutamente nada de produtivo no ressentimento e no ódio. Tais sentimentos não farão de você uma pessoa melhor e mais produtiva. Odiar seu ex-patrão faz tanto sentido quanto odiar aquela padaria da qual você costumava comprar leite. Antes, você via aquela transação como benéfica para você. Hoje, não mais. Grande coisa.

A maioria dos trabalhadores tem uma dívida

Se isso facilita as coisas, vale relembrar que você quase que certamente custou mais à empresa do que de fato contribuiu para ela. [N. do E.: no caso do Brasil, em que um trabalhador custa ao seu patrão o dobro do seu salário bruto, isso é ainda mais certo.]

Lembro-me de já ter tido como colega de trabalho um néscio que se recusou a organizar os estoques no fundo da sala. "Com o salário que ganho não irei fazer isso", dizia ele. E a verdade é que ele ganhava muito mais do que gerava de valor (a propósito, ele foi demitido na mesma semana em que fez isso).

Patrões frequentemente pagam salários antecipando uma determinada produtividade futura do empregado. Ao fazerem isso, esperam estar fazendo algum tipo de investimento para o futuro. Será somente mais tarde que você, como empregado, irá se tornar produtivo o bastante para ser valioso para ele. Quando isso ocorrer, ele irá aumentar seu salário, antecipando uma maior produtividade futura.

Portanto, de certa maneira, todos estamos em dívida para com nosso patrão.

A pior coisa que pode acontecer a um país é ter uma população que parta do princípio que todos os empregos devem ser vitalícios. Na Europa, isto é já é assim. Em um livre mercado, as pessoas mudariam de empregos sem nenhum empecilho. Empregadores iriam livremente contratar e demitir, testando aquelas pessoas mais aptas à vaga de trabalho oferecida. E os empregados fariam exatamente o mesmo com seus patrões. Desta maneira, a probabilidade de satisfação seria muito maior, e os locais de trabalho seriam mais alegres e menos contenciosos. No entanto, não há livre mercado nesta área.

O direito de demitir e de sair

Nada é mais absurdo do que tentar restringir o direito de demitir. Acordos voluntários valem para ambos os lados. O empregado pode pedir para sair, e o empregador pode demitir. Qualquer outro arranjo, como um que restringe um dos lados, representa um ato de coerção que diminui o bem-estar de ambos os lados.

De maneira mais realista, pense em adolescentes e suas primeiras experiências de trabalho. A maioria será demitida de pelo menos um emprego — ou de vários — em seus primeiros anos no mercado de trabalho. Ser demitido nos relembra de nossas obrigações, da natureza contratual do trabalho, e da necessidade de haver consentimento, acordo e voluntariedade em todas as relações sociais. O ato de ser demitido ressalta a existência da liberdade de associação, a qual é a chave para a paz social e o pilar do crescimento econômico. Faça a sua parte e saiba recebê-la também.

E o que fazer ao ser demitido? Absorva tudo o que você aprendeu e siga adiante. Seja ainda mais impressionante em seu próximo emprego. Agindo assim, a probabilidade de você se dar bem será muito maior. E aí você sempre poderá olhar para trás e dizer com um sorriso no rosto: olha só o que aqueles caras estão perdendo!
_________________________________________________________
*Jeffrey Tucker é  CEO do Liberty.Me e diretor de conteúdo da Foundation for Economic Education.  É também autor dos livros It's a Jetsons World: Private Miracles and Public Crimes e Bourbon for Breakfast: Living Outside the Statist Quo

Nenhum comentário:

PEC que acaba com a jornada 6X1 pela 4X3 na canetada impõe jornada laboral igual para profissões diferentes: não vai rolar!

Tivemos uma semana conturbada no setor das relações do trabalho com a proposta do PSOL (PSOL, tinha que ser, como não?) de uma PEC que decre...