segunda-feira, 15 de abril de 2019

Excesso de legislação trabalhista dificulta o entendimento do trabalhador



"As pessoas são meramente o que o legislador quer que elas sejam" (Frédéric Bastiat)


Há exatamente um ano atrás, postei um artigo neste blog sobre a impossibilidade do cumprimento da legislação trabalhista, tanto pela parte do empregador, bem como, pela própria fiscalização, haja vista o volume incomensurável da quantidade de leis e outros diplomas que a compõem. Há sempre um novo decreto, uma nova portaria, uma nota técnica; novas súmulas e jurisprudências vinculantes ou não vinculantes são firmadas e por aí vai.

Então, devemos agora perguntar: esse volume de leis beneficia o trabalhador? Absoluta certeza que não! É o que veremos a seguir.

Tenho repetido que a qualidade da legislação trabalhista não é de todo ruim, entretanto essa escassa qualidade acaba ficando difusa até se perder na volumosa quantidade. Isso em nada contribui para o trabalhador, principal beneficiário dela. É impossível abarcá-la, compreendê-la e usufruí-la por completo. A quantidade de leis trabalhistas não pode de maneira alguma sobrepujar a sua qualidade, porém é o que ocorre no Brasil.

Vejamos como exemplos, algumas situações básicas que ainda muitos trabalhadores não compreendem.

–O trabalhador tem enorme dificuldade em calcular as suas próprias horas-extras.

–Se demitido ou pedir dispensa, não sabe ao certo quais são os seus direitos.

–Não entende corretamente a questão dos períodos aquisitivos de suas férias, até quando a empresa tem prazo para concedê-las, qual o valor da multa se a empresa não cumprir o prazo e sobretudo o prazo de prescrição das mesmas.

–Quantas  advertências podem acarretar em justa causa.

–Não entende corretamente as diferenças entre auxílio-doença, doença ocupacional, acidente de trabalho e a estabilidade relacionada a esses itens.

–Não entende sobre a validade ou legitimidade dos atestados de saúde.

–Não compreende as questões pertinentes à licença maternidade, estabilidade e o período de amamentação, bem como, se faz jus ou não ao auxílio creche.
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–Alguns sequer entendem a diferença entre cargo e função.
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–Questões pertinentes aos descontos em seu salário por danos e prejuízos.

–O Aviso Prévio, até o hoje é o terror do trabalhador que não consegue entender a diferença de Aviso Prévio trabalhado ou indenizado (dispensado de cumprir) e acaba fazendo uma confusão dos diabos.

Citei apenas dez situações básicas (há inúmeras outras) que cada trabalhador deveria estar afiadíssimo sobre todas elas. No entanto, não é o que ocorre na prática. E quando digo trabalhador estou me referindo tanto ao trabalhador do setor operacional, bem como do setor administrativo também. Aliás, recebo muito mais consultas de trabalhadores do setor administrativo do que os do setor operacional.

A tese de que o trabalhador brasileiro não gosta de ler, estudar ou pesquisar sobre os  seus próprios direitos faz sentido até certo ponto. Porém ela vai perdendo força na medida em que a legislação vai se avolumando e se diluindo a tal ponto que às vezes até mesmo especialistas na matéria, tais como advogados trabalhistas, consultores de RH e contadores acabam tropeçando em algum momento, por mais atualizados que estejam. Como exigir então que o trabalhador tenha a legislação que o protege na ponta da língua? Impossível e impraticável.

Esse arsenal de leis que muito atrapalha e nada ajuda, é um grande presente para os empregadores mal intencionados que tripudiam o quanto podem sobre o desconhecimento da legislação de seus empregados. E mais, nem os próprios empregadores dominam a legislação, delegando essa questão para os escritórios contábeis. Estes então, cuidam apenas da parte técnica e burocrática que se traduz em cálculos e o recolhimento dos encargos, porém sem a assessoria preventiva da legislação, salvo contrato a parte no qual o preço dos honorários  sairá muito mais caro para o empregador.

Tomemos como exemplo apenas um tema trabalhista, o do Abandono de Emprego. Por incrível que pareça, há volumosos compêndios (eu mesmo tenho três volumes sobre o tema), verdadeiros tijolaços de mil páginas escritos por juristas, cada um com sua doutrina só para tratar desse tema. Praticamente cada tema (isso mesmo, cada tema!) dos direitos trabalhistas no Brasil se transforma nesses tijolos inúteis ao gosto de cada jurista que os escreve. Isso é uma afronta ao trabalhador e que somente serve pra confundi-lo ainda mais do que já está.

A legislação do trabalho na maioria dos países é enxuta e acessível a todo trabalhador, como por exemplo, a Fair Labor Standarts Act (FLSA), nos Estados Unidos, criada em 1938 e em vigor até hoje. Sucinta e bem flexível, ela é  baseada em contratos entre empregador e empregado. Até mesmo na China, o novo Código Chinês do Trabalho de 2009 é acessível a todos os trabalhadores.

A legislação trabalhista no Brasil, prolixa que é, na forma e no conteúdo acaba esmagando o trabalhador, lançando-o a um limbo burocrático confuso, repleto de dúvidas e incertezas e infinito de normas técnicas, portarias, súmulas, jurisprudências e que tais, de maneira que jamais ele se sentirá seguro para dizer para si mesmo: eu conheço, domino e compreendo os meus direitos trabalhistas.

O Brasil é o único país do mundo em que os direitos trabalhistas básicos estão constitucionalizados a partir da Constituição Federal de 1988, fato esse que a maioria dos trabalhadores  desconhece, salvo os profissionais de RH e olhe lá, já conheci profissionais do setor que nem isso sabiam.

Quando a CLT estava sendo elaborada tendo como modelo o documento fascista “Carta del Lavoro”, nenhum trabalhador foi consultado se realmente era isso que ele queria. Caso houvesse um referendo, essa aberração seria rejeitada em praticamente sua totalidade de 922 artigos. Todo volume de leis trabalhistas que existe hoje, decorre diretamente desse diploma que é literalmente uma tijolada na cabeça de cada trabalhador.

O Estado não tem e nunca terá competência para dizer o que melhor se adequa ao trabalhador que infelizmente se habituou a aceitar a mão de chumbo desse Estado que o esmaga impiedosamente. O trabalhador é proprietário absoluto de sua mão de obra e deve vendê-la ou oferecê-la como bem entender.

Enquanto os direitos trabalhistas no Brasil estiverem espalhados em vários diplomas jurídicos como peças soltas de um quebra-cabeças que nunca se completa e ninguém jamais entende, os trabalhadores continuarão perdidos num ponto cego e vulneráveis, escandalosamente vulneráveis e alvos fáceis à próxima tijolada do Estado, uma usina que produz tijolos jurídicos trabalhistas alucinadamente, desnecessários, ineficientes e fatais.


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